João da Silva está entediado.
Recentemente ele se perguntou o que tinha feito de bom para si mesmo e ao mundo. Algo de emocionante e inesquecível. E concluiu que tudo passou sem ele nem se dar ao trabalho de olhar para o lado. E quando o fez, era tudo chato. Ele, sua vida, seu cabelo e até seus sapatos eram chatos. Um tédio.
João está entediado.
Seus olhos vazios procuram uma resposta. Uma saída. Ele se distrai com a música que está tocando em seu rádio, naquele momento. "Smoke get in your eyes" toca gentilmente. João da Silva sorri. Aquela música é muito especial para ele. Foi ao som dela que João da Silva tinha feito seu primeiro trabalho. Mas isso aconteceu há uns trinta anos atrás, quando ele era apenas um rapaz de vinte e um anos, cheio de sonhos e planos. Nesse momento ele não se lembra bem os motivos que o levaram a seguir aquela carreira. Mas desde então, ele não podia parar. E não queria fazê-lo. Até aquele momento. Afinal, aquela profissão é certa? Ele pode trocar para algo mais suburbano, algo de trabalho fixo durante o dia, jantar em família à noite. Contudo, quem vai empregá-lo com aquela idade? E o que ele sabe fazer além daquilo? Foi aquilo que ele sempre fez e só aquilo que ele sabe fazer. Profissionalmente, é claro.
Ele dá uma coçada no olho direito. Boceja. Desliga o rádio no meio de uma música qualquer, só esticando o braço, sem sair de posição, momento algum.
João, então, se lembra que precisa comprar umas coisas no mercado, depois. Vamos lá, é a comida do cachorro, uns sucrilhos e ovos. Não pode esquecer-se de arroz integral, iogurte e umas frutas. O médico o mandou diminuir o açúcar, cortar o álcool e comer mais frutas, vegetais e um monte de lixo natureba. Só de pensar, ele quer morrer. Mas que se foda, também vai comprar uma caixa de chocolates, duas garrafas de vodca para seu velho amigo, o Bloody Mary, cerveja e obviamente um pacote de jujubas. Desde moleque, esse é seu vício. Digo, sentar em frente ao aparelho de televisão e assistir a um bom filme. Ele, particularmente, gosta muito de comédias românticas e dramas. Dá uma coçada na bunda. Dramas do Leste Europeu, sabe? Ou mesmo o cinema francês, todo cheio de poesia e beleza. Ou aqueles filmes japoneses, cheios de lições de moral, de vida e de história sem ação. Não que ele não gostasse de cinema norte-americano. Karatê Kid é um clássico e os Goonies são realmente bons, apesar do Sloth ser meio molenga. Mas no geral, os filmes americanos são meio tediosos, como por exemplo, aquele filme do.
João da Silva é interrompido. Por um pombo idiota que entrou pela janela e cagou em seu braço. Filho da puta. Depois João cuida desse bicho nojento.
Ele acende um cigarro e se lembra que tem de ligar para a mãe. Aquela senhora já tem seus setenta e três anos e continua ativa pra diabo. E ele faz o possível para falar com ela, no mínimo, duas vezes por semana e, agora, já é sexta-feira e ele não ligou pra ela nenhuma vez ainda. Se ela o visse ali, naquele momento, no penúltimo andar de um prédio abandonado, junto à janela, diria que ele precisa se casar pra aprender a viver como um homem. Mas ele já pensou nisso e já quase engrenou num casamento, mas é duro para as mulheres lidarem com sua profissão. Por mais que elas tentem. E isso o faz sentir mais arrependimento. E vergonha por ser que é e fazer o que faz. Seria incrível ter família. Filhos. E provavelmente, ele já teria netos. Mas não. Ele é um velho careca e beberrão, fazendo uma dieta idiota, furando a dieta de vez em quando e vendo filmes a maior parte do tempo. Mas que droga de vida é a vida de João da Silva. Ele boceja outra vez, só em pensar nisso. E na sua vidinha de merda tediosa e chata. Em que ele se engana sempre e tem momentos de felicidade de vez em.
Ele é interrompido mais uma vez.
Dessa vez, pelo alarme do seu relógio de pulso. Já é hora dele trabalhar. Pra valer. Ele toma seu instrumento de trabalho em mãos e então se mantém fixo, como o artista tentando captar o momento exato da inspiração, olhando lá pra baixo, pra rua, onde começa a passar um grupo de pessoas. Fanfarra. Polícia. E lá está o carro do presidente. O recém-eleito presidente.
João da Silva nem faz muito esforço. O carro é aberto, um conversível e tanto, ele diria. Foi olhar e atirar. Nesse caso, três vezes. Acertou-o na cabeça e no peito. O terceiro tiro acertou em cheio o banco do carro. Matou aquele pedaço de couro estofado. Hora do óbito: nove horas e quarenta e um minutos.
As pessoas ficam em pânico. A polícia em rebuliço. O presidente está morto.
João da Silva se mantém, olhando a movimentação. Dois de três tiros. Não seria nada mal para qualquer um outro, mas pra ele é como se um padre tivesse errado o Pai-Nosso.
Eu devo estar ficando velho, pensa consigo.
João sai da janela e guarda o rifle. Ajeita a gravata e desce calmamente a construção. Lá embaixo, pára perante a multidão que se atropela, fitando-a, orgulhoso. Dá um tapa na testa.
O suco de tomate! Ele não pode se esquecer de comprar o maldito suco de tomate. Onde já se viu um Bloody Mary sem suco de tomate?
É, ele está ficando velho mesmo.
20041229
20041225
Natal. Netel. Nitil. Notol. Nutul. Nãotãol.
É isso aí, criançada. Tá acabando o Natal.
Em dois minutos é dia 26 e todas as pessoas vão voltar a ter aquela cara feia de sempre com o mau-humor exalando de seus poros suados, se mal-dizendo por suas existências insignificantes.
Por isso vamos aproveitar esses dois minutos que nos restam.
Afinal, Natal é só uma vez por ano.
Feliz Crimble!
20041130
Tomas
Tom segue rua abaixo, com o passo apertado. De vez em quando, olha para trás e apesar da rua cheia, um rosto insiste em repetir-se em meio à multidão. Um homem, magro, alto e com cara de poucos amigos. Tom está inquieto. Seria muita coincidência dois homens seguirem a mesma direção, sentido e ritmo por uma rua inteira ou duas?
Ele não sabe responder mas seus passos o levam para dentro de um banco, onde ele trata de se colocar ao fim de uma fila, sequer olhando quem está nela.
Com a respiração arrítmica e um suor frio escorrendo pelo seu rosto, ele vira para trás, em direção à porta giratória. E aguarda. O homem estava há uns 10 metros dele. Ele entrará a qualquer momento. Seus olhos são dois pontos negros, encarando fixamente a porta giratória, ao som único e apavorante de sua respiração perturbada pelas batidas secas de seu coração, com seu sangue torridamente gelado e pensando em nada, pois nada lhe convém pensar.
Ele aguarda alguns instante e gradualmente recupera o fôlego e o sangue amorna-se novamente mas as batidas continuam a cortar-lhe o ouvido. Se o homem não entrou até então, ele provavelmente já foi embora. Só resta a Tom arriscar-se e sair novamente da segurança do banco para os perigos inimagináveis de uma rua cheia de estranhos.
Ainda de olhos fixos à porta, ele pisa um passo meio duro e depois outro e segue, encarnado-a, ganhando velocidade e aproxima-se lentamente da porta. Caminha como o homem condenado à forca, que vai em direção ao seu insólito destino, sem chance de voltar. A porta está à sua frente e quando Tom está a cinco passos dela, resolve acender um cigarro. Aliás, precisa acender um cigarro. Maldito vício!
Pára.
Com os olhos ainda fixos à porta e ignorando qualquer aviso de proibido fumar, enfia a mão no direito do paletó, pega o maço de cigarros e antes que possa sacá-lo do bolso, um som consegue ser alto o suficiente para interromper-lhe as batidas de perturbarem seus ouvidos e o distrai.
Seus olhos então desviam-se finalmente da porta giratória e ao olharem para dentro do banco, observam as pessoas, todas, deitadas ao chão. E dois homens armados o encaram junto à porta, visivelmente apressados e tensos. A insegurança exala de seus olhos miúdos de ladrões baratos e é cravada pelo leve tremular de suas mãos empunhando aquelas pistolas semi-automáticas roubadas.
Tom os observa atônito, imóvel. Impassível. Os homens parecem gritar com Tom, mas Tom não parece ouvi-los.
Encarando-os nos olhos, em um movimento brusco, ele puxa a mão do bolso, trazendo consigo o maço de cigarros.
E o som de tiros penetram-lhe o pensamentos. Quente, seco e dilacerante, sobrepujando-lhe o som da batida e rasgando-lhe o invólucro da alma e da ignorância.
Ele cai. Sentindo a vida vazar de seu corpo, ele ouve os gritos e choros assustados daquele lugar. Levando a mão para sobre seu corpo, sente algo transbordar de si, algo quente e vital.
Pela primeira vez em sua vida, Tomas Bernt sentiu a liberdade transbordando de seu corpo, numa sensação única em meio à mediocridade em que sempre se viu.
Antes que tudo aquilo acabasse, Tom riu-se.
E deixou que o sangue gelasse mais uma vez.
Ele não sabe responder mas seus passos o levam para dentro de um banco, onde ele trata de se colocar ao fim de uma fila, sequer olhando quem está nela.
Com a respiração arrítmica e um suor frio escorrendo pelo seu rosto, ele vira para trás, em direção à porta giratória. E aguarda. O homem estava há uns 10 metros dele. Ele entrará a qualquer momento. Seus olhos são dois pontos negros, encarando fixamente a porta giratória, ao som único e apavorante de sua respiração perturbada pelas batidas secas de seu coração, com seu sangue torridamente gelado e pensando em nada, pois nada lhe convém pensar.
Ele aguarda alguns instante e gradualmente recupera o fôlego e o sangue amorna-se novamente mas as batidas continuam a cortar-lhe o ouvido. Se o homem não entrou até então, ele provavelmente já foi embora. Só resta a Tom arriscar-se e sair novamente da segurança do banco para os perigos inimagináveis de uma rua cheia de estranhos.
Ainda de olhos fixos à porta, ele pisa um passo meio duro e depois outro e segue, encarnado-a, ganhando velocidade e aproxima-se lentamente da porta. Caminha como o homem condenado à forca, que vai em direção ao seu insólito destino, sem chance de voltar. A porta está à sua frente e quando Tom está a cinco passos dela, resolve acender um cigarro. Aliás, precisa acender um cigarro. Maldito vício!
Pára.
Com os olhos ainda fixos à porta e ignorando qualquer aviso de proibido fumar, enfia a mão no direito do paletó, pega o maço de cigarros e antes que possa sacá-lo do bolso, um som consegue ser alto o suficiente para interromper-lhe as batidas de perturbarem seus ouvidos e o distrai.
Seus olhos então desviam-se finalmente da porta giratória e ao olharem para dentro do banco, observam as pessoas, todas, deitadas ao chão. E dois homens armados o encaram junto à porta, visivelmente apressados e tensos. A insegurança exala de seus olhos miúdos de ladrões baratos e é cravada pelo leve tremular de suas mãos empunhando aquelas pistolas semi-automáticas roubadas.
Tom os observa atônito, imóvel. Impassível. Os homens parecem gritar com Tom, mas Tom não parece ouvi-los.
Encarando-os nos olhos, em um movimento brusco, ele puxa a mão do bolso, trazendo consigo o maço de cigarros.
E o som de tiros penetram-lhe o pensamentos. Quente, seco e dilacerante, sobrepujando-lhe o som da batida e rasgando-lhe o invólucro da alma e da ignorância.
Ele cai. Sentindo a vida vazar de seu corpo, ele ouve os gritos e choros assustados daquele lugar. Levando a mão para sobre seu corpo, sente algo transbordar de si, algo quente e vital.
Pela primeira vez em sua vida, Tomas Bernt sentiu a liberdade transbordando de seu corpo, numa sensação única em meio à mediocridade em que sempre se viu.
Antes que tudo aquilo acabasse, Tom riu-se.
E deixou que o sangue gelasse mais uma vez.
20041106
KORN FLAKES - Uma Lembrança.
Sei lá, ando muito saudosista. De vez em quando eu me reservarei no direito de publicar algo velho do KoRn Flakes que eu tenho aqui guardado. O de hoje é muito especial. E idiota. Afinal, o que era o koRn Flakes senão um blogue idiota?
Esse texto, uma crônica de uma dia real da minha vida é do dia dez de setembro de 2003.
O INCRÍVEL MUNDO DAS ERVILHAS ZUMBIS E OUTRAS HISTÓRIAS EXCÊNTRICAS.
Eu sou uma pessoa bastante distraída. Eu me distraio e me esqueço das coisas com uma velocidade assustadora. Pode ser efeito da água mineral natural sem gás. Mas o maior problema é que eu acabo falando demais ou agindo demais em momentos errados. Com pessoas erradas. Praticamente todo dia tem um "fora" novo que eu dou por aí. Eu sou o Rei dos Foras.
O mais recente foi esses dias. No centro de São Paulo, estava eu a procurar um suspensório bem bonito e divertido. Eu encontrei! Uma felicidade. Enquanto eu saía saltitante pelas ruas e esquinas cantarolando alguma canção ou hino de alegria extrema, na tentativa de compartilhar minha felicidade decido dar uma moeda a um mendigo. Eu quase nunca dou, nunca tenho grana, mas 25¢ não me fariam falta naquele meu momento de tamanho êxtase.
Numa calçada, aquelas com uma mureta que tem árvores, onde as pessoas se sentam, tinha lá, um de cada tipo: Um sem uma perna, outra com elefantíase, um ou dois cegos, outro com as perninhas engraçadinhas, enfim, uma desgraça ao lado da outra e eu escolhendo qual seria a premiada. E sentada ao lado de tudo isso, uma mulher, também com cara de cansada, com um carrinho de bebês com uma criança dentro. Aquele sol, a criança, o olhar cansado, porra, ela precisava mais de 25¢ do que qualquer outro. Ela tinha uma criança!
Me aproximo. Ela me fita. Eu sorrio. Estendo a mão, coloco a moedinha dentro do carrinho de bebê, jogo a moeda, dou um sorriso ainda maior com um olhar de propaganda de margarina. Aparentemente, ela não ficou feliz. Enfim, viro-me e vou saindo, com um ar de dever cumprido, feliz da vida porque eu ajudei, com pouca coisa, uma mulher necessitada. Dois passos vitoriosos me afastam da mulher.
- EU NÃO SOU MENDIGA NÃO! MAS QUE FILHO DA PUTA! - Pega a minha moeda, taca no chão com violência. Continua aos berros. - EU NÃO PRECISO DESSE SEU DINHEIRO DE MERDA! EU NÃO SOU MENDIGA!
Merda. Fodeu. A mulher estava sentada provavelmente descansando. Tinha uma loja em frente. Daquelas cheias de gente se acotovelando. Alguém deve ter entrado lá e ela ficou esperando a pessoa sair, já que ela com um carrinho de bebê não consegue entrar nesses lugares cheios. E eu piedosamente lhe dou 25¢. Eu saí, sem olhar pra trás, só apertei o passo e torci para que ela não tivesse um bumerangue.
Esse texto, uma crônica de uma dia real da minha vida é do dia dez de setembro de 2003.
Eu sou uma pessoa bastante distraída. Eu me distraio e me esqueço das coisas com uma velocidade assustadora. Pode ser efeito da água mineral natural sem gás. Mas o maior problema é que eu acabo falando demais ou agindo demais em momentos errados. Com pessoas erradas. Praticamente todo dia tem um "fora" novo que eu dou por aí. Eu sou o Rei dos Foras.
O mais recente foi esses dias. No centro de São Paulo, estava eu a procurar um suspensório bem bonito e divertido. Eu encontrei! Uma felicidade. Enquanto eu saía saltitante pelas ruas e esquinas cantarolando alguma canção ou hino de alegria extrema, na tentativa de compartilhar minha felicidade decido dar uma moeda a um mendigo. Eu quase nunca dou, nunca tenho grana, mas 25¢ não me fariam falta naquele meu momento de tamanho êxtase.
Numa calçada, aquelas com uma mureta que tem árvores, onde as pessoas se sentam, tinha lá, um de cada tipo: Um sem uma perna, outra com elefantíase, um ou dois cegos, outro com as perninhas engraçadinhas, enfim, uma desgraça ao lado da outra e eu escolhendo qual seria a premiada. E sentada ao lado de tudo isso, uma mulher, também com cara de cansada, com um carrinho de bebês com uma criança dentro. Aquele sol, a criança, o olhar cansado, porra, ela precisava mais de 25¢ do que qualquer outro. Ela tinha uma criança!
Me aproximo. Ela me fita. Eu sorrio. Estendo a mão, coloco a moedinha dentro do carrinho de bebê, jogo a moeda, dou um sorriso ainda maior com um olhar de propaganda de margarina. Aparentemente, ela não ficou feliz. Enfim, viro-me e vou saindo, com um ar de dever cumprido, feliz da vida porque eu ajudei, com pouca coisa, uma mulher necessitada. Dois passos vitoriosos me afastam da mulher.
- EU NÃO SOU MENDIGA NÃO! MAS QUE FILHO DA PUTA! - Pega a minha moeda, taca no chão com violência. Continua aos berros. - EU NÃO PRECISO DESSE SEU DINHEIRO DE MERDA! EU NÃO SOU MENDIGA!
Merda. Fodeu. A mulher estava sentada provavelmente descansando. Tinha uma loja em frente. Daquelas cheias de gente se acotovelando. Alguém deve ter entrado lá e ela ficou esperando a pessoa sair, já que ela com um carrinho de bebê não consegue entrar nesses lugares cheios. E eu piedosamente lhe dou 25¢. Eu saí, sem olhar pra trás, só apertei o passo e torci para que ela não tivesse um bumerangue.
20041024
O Nexo Anexo do Septo em Trauma
(por capt. Dimitri Moloko)
O apogeu do cheirador
acontecia nas tardes mais belas.
aquele dito inútil e feio
antecipava o sabor do refresco;
agora, entupido, não cheira.
sangra. dói. incha.
E a platéia grita
-uga uga uga hei.
..
Eu sou um artista.
Eu transformo a minha dor em arte.
O apogeu do cheirador
acontecia nas tardes mais belas.
aquele dito inútil e feio
antecipava o sabor do refresco;
agora, entupido, não cheira.
sangra. dói. incha.
E a platéia grita
-uga uga uga hei.
..
Eu sou um artista.
Eu transformo a minha dor em arte.
20041011
A Lei de Murphy aplicada à vida
Eu sou uma pessoa com uma tendência enorme à acidentes, erros e no azar em geral. Falando no geral, isso me diverte, às vezes. É a velha e boa tragicomédia. Só que aí tem vezes que isso sai do controle. E é difícil até pra eu mesmo acreditar nessa sucessão de fatos.
Na última terça-feira, 5, Eu estava em casa, lendo jornal, assistindo TV, jogando hóquei, essas coisas. Então, um estalo que me faz grudar no teto. E a luz se apaga. Em seguida, um estrondo ecoa pela rua. Resquícios de uma explosão. "Deve ter sido aquela coisa do poste que nos dá a energia elétrica". Pode ter sido. Desliguei os aparelhos eletrônicos da tomada, mas só aqueles mais acessíveis e fáceis de religar depois que a energia voltasse. cerca de 10 min depois, a energia volta, religo tudo e constato que o meu modem do Ispídi, internet rápida e trambiques, não liga. Queimou. Vou ao telefone. O telefone também queimou. Lá fora, as pessoas gritam horrorizadas, pois aparentemente a explosão queimou suas retinas e derreteu suas genitálias. Rapidamente me tranco em casa. Meu coração palpita numa velocidade inédita e sento-me para ler o jornal, perguntando-me "O que será que vai passar na TV?"
No mesmo dia, lá na rua apareceu um carro da operadora de telefones/internet mexendo naquelas caixas de telefone que todos conhecemos, certo?
Enfim, eles começam a mexer naquilo. E nada do telefone voltar. Passam-se quarta, quinta e sexta-feira. Todos os dias aqueles homens mexem na maldita caixa e o telefone continua na mesma. Rumores indicam que aqueles homens, na verdade, eram agentes da Polícia Especial e naquela caixa havia uma bomba escondida. "Novidade", pensei.
Sábado, mais um dia isolado do mundo, sem a menor perspectiva de vida. Um feriado pela frente, uma bomba na rua e tudo caminha para o lado escuro da força. Mais à noite, lá para umas 19h, estou fazendo uns desenhos pra um trabalho e rasgando o silêncio daquela casa triste e morta, o insuportável som do telefone soa como as trombetas dos anjos depois do apocalipse. Festejamos! Todos nós! Eu, minha família, Alf e meu papagaio.
Então, ligo para o negócio da internet banda larga. "Vamos resolver isso de uma vez" eu digo. Resolvi tudo no telefone e em dois dias, 48h no máximo eles viriam me ajudar. No outro dia de manhã, 9h30 o homem chega. Domingo de manhã;aquele marasmo é cortado pela euforia de poder enfim acessar as maravilhas da internet, a pornografia gratuita e o dinheiro fácil com imigrantes ilegais. O homem troca o modem, faz uns testes e vai embora. Eu sento-me diante do monitor com um sorriso vitorioso. Começo a olhar uns sites.. tantos dias longe, tanta coisa pra fazer.. Fico olhando os sites por cerca de 40 minutos. As cores do monitor começam a embaçar. A imagem se distorce, tudo se retorce. Espíritos tentavam se comunicar comigo através daquele aparelho elétrico. "Porra..", pensei "Não tem pão velho", disse. Então, em um flash luminoso, a tela fica toda escura, exceto por uma linha branca, horizontal, insinuante. Gentilmente e delicadamente como Charles Bronson, dou um tapinha no lado do monitor. A imagem some. O monitor pifa. E fim.
Agora, nesse momento, estou em uma lan house. Essa garotada jogando qualquer jogo, xingando-se fervorosamente e eu, aqui, me sentindo um estranho no ninho, um mosquito na sopa; eu precisava fazer umas pesquisas de um trabalho que é pra quarta-feira. Fiz uma bela pesquisa, e em material a separar, eu tinha mais de 60 páginas. Só que quando eu fui salvar pra me enviar por e-mail pra eu depois ver se conseguiria fazer, descubro que como é computador de loja, eu não tenho essas regalias. Tentei me enviar tal documento através de um programa mas aparentemente, não deu certo. Foi tudo em vão.
Por causa do feriado, da explosão e de um ataque alienígena, só vou ter um novo monitor na qurta-feira, 13.
E já são tantos fatos absurdamente azarados que eu já não sei dizer, com certeza, o que aconteceu de verdade.
Na última terça-feira, 5, Eu estava em casa, lendo jornal, assistindo TV, jogando hóquei, essas coisas. Então, um estalo que me faz grudar no teto. E a luz se apaga. Em seguida, um estrondo ecoa pela rua. Resquícios de uma explosão. "Deve ter sido aquela coisa do poste que nos dá a energia elétrica". Pode ter sido. Desliguei os aparelhos eletrônicos da tomada, mas só aqueles mais acessíveis e fáceis de religar depois que a energia voltasse. cerca de 10 min depois, a energia volta, religo tudo e constato que o meu modem do Ispídi, internet rápida e trambiques, não liga. Queimou. Vou ao telefone. O telefone também queimou. Lá fora, as pessoas gritam horrorizadas, pois aparentemente a explosão queimou suas retinas e derreteu suas genitálias. Rapidamente me tranco em casa. Meu coração palpita numa velocidade inédita e sento-me para ler o jornal, perguntando-me "O que será que vai passar na TV?"
No mesmo dia, lá na rua apareceu um carro da operadora de telefones/internet mexendo naquelas caixas de telefone que todos conhecemos, certo?
Enfim, eles começam a mexer naquilo. E nada do telefone voltar. Passam-se quarta, quinta e sexta-feira. Todos os dias aqueles homens mexem na maldita caixa e o telefone continua na mesma. Rumores indicam que aqueles homens, na verdade, eram agentes da Polícia Especial e naquela caixa havia uma bomba escondida. "Novidade", pensei.
Sábado, mais um dia isolado do mundo, sem a menor perspectiva de vida. Um feriado pela frente, uma bomba na rua e tudo caminha para o lado escuro da força. Mais à noite, lá para umas 19h, estou fazendo uns desenhos pra um trabalho e rasgando o silêncio daquela casa triste e morta, o insuportável som do telefone soa como as trombetas dos anjos depois do apocalipse. Festejamos! Todos nós! Eu, minha família, Alf e meu papagaio.
Então, ligo para o negócio da internet banda larga. "Vamos resolver isso de uma vez" eu digo. Resolvi tudo no telefone e em dois dias, 48h no máximo eles viriam me ajudar. No outro dia de manhã, 9h30 o homem chega. Domingo de manhã;aquele marasmo é cortado pela euforia de poder enfim acessar as maravilhas da internet, a pornografia gratuita e o dinheiro fácil com imigrantes ilegais. O homem troca o modem, faz uns testes e vai embora. Eu sento-me diante do monitor com um sorriso vitorioso. Começo a olhar uns sites.. tantos dias longe, tanta coisa pra fazer.. Fico olhando os sites por cerca de 40 minutos. As cores do monitor começam a embaçar. A imagem se distorce, tudo se retorce. Espíritos tentavam se comunicar comigo através daquele aparelho elétrico. "Porra..", pensei "Não tem pão velho", disse. Então, em um flash luminoso, a tela fica toda escura, exceto por uma linha branca, horizontal, insinuante. Gentilmente e delicadamente como Charles Bronson, dou um tapinha no lado do monitor. A imagem some. O monitor pifa. E fim.
Agora, nesse momento, estou em uma lan house. Essa garotada jogando qualquer jogo, xingando-se fervorosamente e eu, aqui, me sentindo um estranho no ninho, um mosquito na sopa; eu precisava fazer umas pesquisas de um trabalho que é pra quarta-feira. Fiz uma bela pesquisa, e em material a separar, eu tinha mais de 60 páginas. Só que quando eu fui salvar pra me enviar por e-mail pra eu depois ver se conseguiria fazer, descubro que como é computador de loja, eu não tenho essas regalias. Tentei me enviar tal documento através de um programa mas aparentemente, não deu certo. Foi tudo em vão.
Por causa do feriado, da explosão e de um ataque alienígena, só vou ter um novo monitor na qurta-feira, 13.
E já são tantos fatos absurdamente azarados que eu já não sei dizer, com certeza, o que aconteceu de verdade.
20040930
Sagrado/Profano - Histórias trágicas de um pirata
Quando eu era criança, eu assistia Faustão, e adorava.
Eu e minha irmã assistíamos ao Domingão do Faustão e yada yada. Deixei de assistir Faustão na casa dos 10, 11 anos de idade.
No último domingo me peguei assistindo Faustão novamente. A Xuxa estava lá, poxa. E isso me lembrou de uma história.
Eu já não costumava dar aquela forcinha para o Faustão, como de costume. Eu já tava lá pelos meus 12 anos. Eu e Carolina, a irmã, assistíamos àquela algazarra televisa no meio do domingo. Então, Faustão disse:
"E logo após os reclames do plim-plim, a mulher que requebra na igreja tomando graviola dando um show de sensualidade com um cachorro e dois pedaços de carne!"
Eu logo me pronunciei, com minha então voz de pré-adolescente:
-O que diabos são esses reclames do plim-plim? Desde pequeno eu escuto ele chamar mas nunca vi esses reclames do plim-plim. Mas que droga!
-Duh, são os comerciais, ela diz.
-Ah... -respondo eu.
FIM
Eu e minha irmã assistíamos ao Domingão do Faustão e yada yada. Deixei de assistir Faustão na casa dos 10, 11 anos de idade.
No último domingo me peguei assistindo Faustão novamente. A Xuxa estava lá, poxa. E isso me lembrou de uma história.
Eu já não costumava dar aquela forcinha para o Faustão, como de costume. Eu já tava lá pelos meus 12 anos. Eu e Carolina, a irmã, assistíamos àquela algazarra televisa no meio do domingo. Então, Faustão disse:
"E logo após os reclames do plim-plim, a mulher que requebra na igreja tomando graviola dando um show de sensualidade com um cachorro e dois pedaços de carne!"
Eu logo me pronunciei, com minha então voz de pré-adolescente:
-O que diabos são esses reclames do plim-plim? Desde pequeno eu escuto ele chamar mas nunca vi esses reclames do plim-plim. Mas que droga!
-Duh, são os comerciais, ela diz.
-Ah... -respondo eu.
20040902
20040829
A menina do deserto
Dolores acorda e ainda de olhos fechados, sente o calor irradiando do chão. O solo é fofo, de uma areia fina e o calor é intenso. Ela abre os olhos e olha ao redor. Areia e mais areia. O sol escaldante e areia. Um vento fraco. Areia, areia, areia.
Ela não se lembra como foi parar ali e nem se lembra de muita coisa. Em sua busca pela memória, só encontra seu nome e alguns sentimentos confusos. Dolores se sente desamparada, vê que ali ela só poderia vagar. No alto de seus treze anos, ela sente-se como uma menina no deserto.
A intensidade do calor parece aumentar e ela caminha, sem direção certa. No horizonte, dunas de areia parecem amontoar-se desesperadamente; ela não tem sinal de civilização e aparentemente, não terá pelas próximas horas. Ela vê apenas imagens ao longe, imagens desconexas. Miragens, ela pensa. Dolores também ouve vozes, que ecoam pelo deserto. vozes familiares e agradáveis, porém desordenadas e muitas vezes amarguradas.
-Você tomou muito sol na cabeça, sua estranha, ela repetia para si mesma.
Ao fim da caminhada, ela cai exausta e sem energia para continuar. Está anoitecendo e, bruscamente, a temperatura cai e Dolores apenas está de encontro àquele chão gelado, tremendo e batendo os dentes, sentindo seu corpo adormecer. As vozes, gradativamente tornam-se mais claras.
"Você vai ficar bem. Vai dar tudo certo."
"Logo, logo você vai sair daqui."
Tudo torna-se escuro de uma vez. Ela escuta uma voz clara, melodiosa e arrogante. O volume da voz é alto e direto. É a voz de sua mãe.
"Ela está acordando..!"
Dolores abre os olhos. Sua mãe, o médico, seu pai, a enfermeira ranzinza sem razão e uma segunda enfermeira mais próxima ao seu soro, ao lado da cama, com uma seringa em mãos. Todos a olham com expectativa, ao redor da sua cama. Dolores não entende bem o que se passa. Ela vê que está atada à cama, paredes frias e escuras, lençóis brancos, um chão cinzento. Seus olhos fixam-se sobre uma fotografia na cabeceira. Uma garota bonita, sorridente, feliz. Seu coração começa a palpitar. Mas sente um alívio. Ela não se lembrava de como a felicidade era algo tão simples. Contudo, quem é essa garota? não é sua filha, afinal ela não se lembra de nada parecido. Seria algum parente? uma amiga, uma vizinha? Ou talvez seria... sim, era ela mesma, talvez aos treze anos, no máximo quatorze. Ela era feliz, quem sabe ainda fosse. Leva as mãos ao rosto, e vê que suas mãos estão profundamente envelhecidas, suas mãos estão fracas, magras, secas. Seu rosto é flácido e com profundas olheiras. Ela olha para a foto novamente na cabeceira. quantos anos ela passou ali naquela cama? Vinte, trinta, provavelmente mais. Quem sabe cinqüenta anos ali, presa, inútil! Mas, por quê? O que ela tinha feito de tão ruim que.
Uma voz interrompe seus pensamentos. Era o médico.
-Como você está, Dolores?
Ela sente-se agoniada. Desesperada, revoltada, inútil; ela começa a chorar e grita. Grita por socorro, grita pedindo por ajuda. Grita.
-Enfermeira, dê uma dose generosa de calmante para nossa garota, ela ainda precisa descansar.
A mãe, com lágrimas nos olhos e uma feição cansada, antiga, abraça o pai. Eles choram juntos. Dolores olha para a direita e vê a enfermeira número dois aplicar a injeção em seu soro. Instantaneamente, sente seu braço queimar, sua temperatura subir; seu estômago se revira, seus olhos escurecem novamente e o chão parece sumir debaixo de si. A dor, o desespero. Então, o calor. E o alívio.
Dolores acorda e ainda de olhos fechados, sente o calor irradiando do chão. O solo é fofo, de uma areia fina e o calor é intenso. Ela abre os olhos e olha ao redor.
Ela não se lembra como foi parar ali e nem se lembra de muita coisa. Em sua busca pela memória, só encontra seu nome e alguns sentimentos confusos. Dolores se sente desamparada, vê que ali ela só poderia vagar. No alto de seus treze anos, ela sente-se como uma menina no deserto.
A intensidade do calor parece aumentar e ela caminha, sem direção certa. No horizonte, dunas de areia parecem amontoar-se desesperadamente; ela não tem sinal de civilização e aparentemente, não terá pelas próximas horas. Ela vê apenas imagens ao longe, imagens desconexas. Miragens, ela pensa. Dolores também ouve vozes, que ecoam pelo deserto. vozes familiares e agradáveis, porém desordenadas e muitas vezes amarguradas.
-Você tomou muito sol na cabeça, sua estranha, ela repetia para si mesma.
Ao fim da caminhada, ela cai exausta e sem energia para continuar. Está anoitecendo e, bruscamente, a temperatura cai e Dolores apenas está de encontro àquele chão gelado, tremendo e batendo os dentes, sentindo seu corpo adormecer. As vozes, gradativamente tornam-se mais claras.
"Você vai ficar bem. Vai dar tudo certo."
"Logo, logo você vai sair daqui."
Tudo torna-se escuro de uma vez. Ela escuta uma voz clara, melodiosa e arrogante. O volume da voz é alto e direto. É a voz de sua mãe.
"Ela está acordando..!"
Dolores abre os olhos. Sua mãe, o médico, seu pai, a enfermeira ranzinza sem razão e uma segunda enfermeira mais próxima ao seu soro, ao lado da cama, com uma seringa em mãos. Todos a olham com expectativa, ao redor da sua cama. Dolores não entende bem o que se passa. Ela vê que está atada à cama, paredes frias e escuras, lençóis brancos, um chão cinzento. Seus olhos fixam-se sobre uma fotografia na cabeceira. Uma garota bonita, sorridente, feliz. Seu coração começa a palpitar. Mas sente um alívio. Ela não se lembrava de como a felicidade era algo tão simples. Contudo, quem é essa garota? não é sua filha, afinal ela não se lembra de nada parecido. Seria algum parente? uma amiga, uma vizinha? Ou talvez seria... sim, era ela mesma, talvez aos treze anos, no máximo quatorze. Ela era feliz, quem sabe ainda fosse. Leva as mãos ao rosto, e vê que suas mãos estão profundamente envelhecidas, suas mãos estão fracas, magras, secas. Seu rosto é flácido e com profundas olheiras. Ela olha para a foto novamente na cabeceira. quantos anos ela passou ali naquela cama? Vinte, trinta, provavelmente mais. Quem sabe cinqüenta anos ali, presa, inútil! Mas, por quê? O que ela tinha feito de tão ruim que.
Uma voz interrompe seus pensamentos. Era o médico.
-Como você está, Dolores?
Ela sente-se agoniada. Desesperada, revoltada, inútil; ela começa a chorar e grita. Grita por socorro, grita pedindo por ajuda. Grita.
-Enfermeira, dê uma dose generosa de calmante para nossa garota, ela ainda precisa descansar.
A mãe, com lágrimas nos olhos e uma feição cansada, antiga, abraça o pai. Eles choram juntos. Dolores olha para a direita e vê a enfermeira número dois aplicar a injeção em seu soro. Instantaneamente, sente seu braço queimar, sua temperatura subir; seu estômago se revira, seus olhos escurecem novamente e o chão parece sumir debaixo de si. A dor, o desespero. Então, o calor. E o alívio.
Dolores acorda e ainda de olhos fechados, sente o calor irradiando do chão. O solo é fofo, de uma areia fina e o calor é intenso. Ela abre os olhos e olha ao redor.
20040721
Super freak, super freak
Outro dia eu sonhei que eu era o Moacir Franco em "Meu Cunhado".
Eu só queria vir aqui e dividir isso com vocês.
Obrigado,
Eu só queria vir aqui e dividir isso com vocês.
Obrigado,
20040704
Clara oo3
Clara foi almoçar com a amiga, Janete. Janete estava toda animada, em dois dias ia encontrar-se com um namoradinho. Namorado por carta. E por isso, Janete forçou Clara a almoçarem juntas num restaurante light. Comida diet. Éca.
-Porra, Janete, não sei como você conseguiu me convencer a vir aqui. Um monte de mato com mato. Que nojo.
-Ah, Clara, cê exagera, meu. É uma delícia isso aqui. E o melhor: Não engorda, não dá celulite e ainda é de fácil digestão.
-Preferia que comessem meu cu.
-Pára de reclamar e come.
Janete serve-se de saladas e mais saladas. Clara olha tudo meio enojada. Da próxima vez, nem que a Janete aponte uma arma pra cabeça dela, ela vai comer naquele lugar de merda.
Enquanto Janete colocava pequenas porções de mato no prato, Clara atacou os grelhados. Encheu o prato de carne de tudo que é tipo, colocou uma folha de alface, uns cogumelos e uma porção de ovos de codorna. E ela sempre pensava "deus, como eu adoraria que tudo fosse gorduroso, com capa de banha e colesterol". Comida diet. Éca.
Após o tedioso almoço, as duas foram dar um passeio numa feira hippie. Janete queria comprar um presente pro namoradinho.
-Meu, cê acredita que essa noite eu tive o mesmo pesadelo da noite passada?
-Aquele pesadelo?
-É, aquele, tudo em preto-e-branco, o sufocamento, a escuridão e eu acordo. Duas noites seguidas, que inferno.
-Ah, sonho, pesadelo, é tudo coisa pro cérebro não parar de funcionar. Não liga não, Clara.
-É que é meio real, é um saco. Parece mesmo que eu estou.. sei lá..
-Morrendo?
-É, pode ser. Mas é besteira. Isso passa.
-É, com certeza passa. Mudando de assunto, o que eu devo comprar pro Tomas?
-Janete, cê não acha esse lance de namoradinho por carta meio escroto?
-Ah, Clara, você que reclama de tudo. O Tomas é um homem e tanto. Nunca conheci homem como ele, pessoalmente.
-Mas e se todo esse encanto se quebrar quando você chegar lá?
-Pelo menos essa ilusão durou por carta. E fazia tempo que eu não me sentia assim tão... tão...
-Estúpida? Puta?
-Apaixonada, Clara, apaixonada. Um dia você vai se apaixonar e vai ver o que é bom.
-Tá, o que você disser. Eu só acho que é meio perig--
Clara é interrompida por um vendedor exaltado.
-Olhem aqui, donas. Charutos cubanos. Os melhores de todas a região de Honolulu.
-Puxa, charutos são ótimos presentes pro Tomas. Tenho certeza que ele vai adorar.
-Pera, Janete. Moço, eles são cubanos mesmo?
-Cubanos e dos bons, dona, enrolados nas coxas de cubanas fartas.
-Não implica, Clara.
-Moço, Honolulu não é no Hawaii?
-É que.. é um vilarejo em Cuba. Um belíssimo vilarejo, que produzem os melhores charutos.
-Viu, Clara?
-Eu ainda acho que--
-Não implica, Clara.
-Vai levar, dona?
-Vou, me dá uma caixa!
-É presente?
-É sim!
-Tenho certeza que é um homem muito sortudo e de muito bom gosto.
-É o melhor deles!- respondeu Janete, sorrindo.
-Porra, Janete, não sei como você conseguiu me convencer a vir aqui. Um monte de mato com mato. Que nojo.
-Ah, Clara, cê exagera, meu. É uma delícia isso aqui. E o melhor: Não engorda, não dá celulite e ainda é de fácil digestão.
-Preferia que comessem meu cu.
-Pára de reclamar e come.
Janete serve-se de saladas e mais saladas. Clara olha tudo meio enojada. Da próxima vez, nem que a Janete aponte uma arma pra cabeça dela, ela vai comer naquele lugar de merda.
Enquanto Janete colocava pequenas porções de mato no prato, Clara atacou os grelhados. Encheu o prato de carne de tudo que é tipo, colocou uma folha de alface, uns cogumelos e uma porção de ovos de codorna. E ela sempre pensava "deus, como eu adoraria que tudo fosse gorduroso, com capa de banha e colesterol". Comida diet. Éca.
Após o tedioso almoço, as duas foram dar um passeio numa feira hippie. Janete queria comprar um presente pro namoradinho.
-Meu, cê acredita que essa noite eu tive o mesmo pesadelo da noite passada?
-Aquele pesadelo?
-É, aquele, tudo em preto-e-branco, o sufocamento, a escuridão e eu acordo. Duas noites seguidas, que inferno.
-Ah, sonho, pesadelo, é tudo coisa pro cérebro não parar de funcionar. Não liga não, Clara.
-É que é meio real, é um saco. Parece mesmo que eu estou.. sei lá..
-Morrendo?
-É, pode ser. Mas é besteira. Isso passa.
-É, com certeza passa. Mudando de assunto, o que eu devo comprar pro Tomas?
-Janete, cê não acha esse lance de namoradinho por carta meio escroto?
-Ah, Clara, você que reclama de tudo. O Tomas é um homem e tanto. Nunca conheci homem como ele, pessoalmente.
-Mas e se todo esse encanto se quebrar quando você chegar lá?
-Pelo menos essa ilusão durou por carta. E fazia tempo que eu não me sentia assim tão... tão...
-Estúpida? Puta?
-Apaixonada, Clara, apaixonada. Um dia você vai se apaixonar e vai ver o que é bom.
-Tá, o que você disser. Eu só acho que é meio perig--
Clara é interrompida por um vendedor exaltado.
-Olhem aqui, donas. Charutos cubanos. Os melhores de todas a região de Honolulu.
-Puxa, charutos são ótimos presentes pro Tomas. Tenho certeza que ele vai adorar.
-Pera, Janete. Moço, eles são cubanos mesmo?
-Cubanos e dos bons, dona, enrolados nas coxas de cubanas fartas.
-Não implica, Clara.
-Moço, Honolulu não é no Hawaii?
-É que.. é um vilarejo em Cuba. Um belíssimo vilarejo, que produzem os melhores charutos.
-Viu, Clara?
-Eu ainda acho que--
-Não implica, Clara.
-Vai levar, dona?
-Vou, me dá uma caixa!
-É presente?
-É sim!
-Tenho certeza que é um homem muito sortudo e de muito bom gosto.
-É o melhor deles!- respondeu Janete, sorrindo.
20040627
Clara oo2
Clara já estava para sair de casa quando o telefone tocou. Após 2 chamadas e meia, ela atendeu.
-Alô?
-Alô, Clara! Como você vai?
-Tô levando. Quem é?
-Porra, sou eu, o Paulo!
-Ah, oi Paulo! E aí, meu?
-Tem programa pra hoje?
-O que você acha?
-Acho que agora você vai ter. Vamos ao cinema?
-Pois...?
-Pois tá passando Festim Diabólico no cinema novo. Aquele lá, o "cult", hahah, sabe?
-Sei.
-E aí, vamos?
-Não tô a fim.
-Vamos, vai! Cê precisa sair pra se divertir! Vamos?
-Tá, tá legal.
-Beleza! A gente se vê então na Avenida dos Mafagafos, em frente ao cinema, lá pelas duas!
-Tá legal.
-Clara..
-quê?
-Toma cuidado.
-..tá.
Desligando o telefone, ela dirigiu-se para o banheiro, onde tomou um banho demorado, refletindo sobre o sonho da noite anterior. Já era a terceira noite consecutiva que esse sonho a afligia. E apesar dos esforços, eles não pareciam querer parar. Cada noite parecia mais real. Cada vez, tudo soava mais próximo. Ela pouco se importou. Todo mundo morre um dia, mesmo.
Depois do banho, Clara vestiu um jeans desbotado, uma camiseta preta e seu coturno. Amarrou os cabelos curtos num pequeno rabo-de-cavalo e passou as mãos por sobre o rosto. Sentiu algo diferente e correu para olhar-se no espelho. Seu rosto estava como sempre, magro e expressivo. Seu olhar expressava um certo desapontamento.
-Essa merda já tá me deixando paranóica.
Instantes depois, já estava caminhando pela rua. Faltava ainda uma hora, mas ela queria chegar cedo. Um pouquinho ao menos.
Aquele dia estava nublado, mas bastante abafado. Ia chover a qualquer momento, Clara sentia em seus ossos. Mas não levou sequer um guarda-chuva- Eu não sou a bruxa do mágico de Oz pra derreter com água, então, que se foda- e levava apenas uma moedas no bolso e uns 20$ na carteira. O cinema era barato, isso era a menor das preocupações.
Clara tinha um passo apressado, naturalmente. Mesmo que ela não estivesse com pressa, era como se ela estivesse caminhando pra ir para o banco faltando cinco minutos para fechar. Pressa.
Ela associava isso à sua ansiedade crônica. Ela já teve as unhas todas roídas, mas hoje contenta-se em caminhar. Desde cedo sua mãe já dizia Clara, você é muito ansiosa, menina! mas Clara achava isso bom. E justamente por isso ela odeia gente molenga. Falta de propósito na vida, porra.
Enfim, chegou em frente ao cinema. Do outro lado da rua um prédio estava sendo construído. Clara sentou-se no banco e ficou admirando aquele futuro prêmio de concreto, que orgulhava tantas pessoas. Os molengas, no geral. Gente sem propósito na vida. Estúpidos.
Seus pensamentos são interrompidos por propostas, vinda daquela construção. Os pedreiros estavam em horário de almoço.
-E aí, boneca!
Clara ignorou.
-Ih, a boneca é metida.. eu sei do que uma boneca metida gosta..
Clara virou e olhou pro outro lado.
-Ah, bonequnha, cê deve ter uma bela rosca. Dá sua rosca pra mim!
Clara emputeceu-se. Ela gritou.
-E eu lá achei minha rosca no lixo pra dar pra vagabundo? Vai tomar no seu cu!
Os pedreiros riam. Menos o vagabundo, então constrangido, de sorriso amarelo no rosto.
E um ônibus passou a toda velocidade por detrás de Clara, na calçada. Desgovernado, chocou-se contra um prédio.
O estrondo metálico encheu o quarteirão.
-Alô?
-Alô, Clara! Como você vai?
-Tô levando. Quem é?
-Porra, sou eu, o Paulo!
-Ah, oi Paulo! E aí, meu?
-Tem programa pra hoje?
-O que você acha?
-Acho que agora você vai ter. Vamos ao cinema?
-Pois...?
-Pois tá passando Festim Diabólico no cinema novo. Aquele lá, o "cult", hahah, sabe?
-Sei.
-E aí, vamos?
-Não tô a fim.
-Vamos, vai! Cê precisa sair pra se divertir! Vamos?
-Tá, tá legal.
-Beleza! A gente se vê então na Avenida dos Mafagafos, em frente ao cinema, lá pelas duas!
-Tá legal.
-Clara..
-quê?
-Toma cuidado.
-..tá.
Desligando o telefone, ela dirigiu-se para o banheiro, onde tomou um banho demorado, refletindo sobre o sonho da noite anterior. Já era a terceira noite consecutiva que esse sonho a afligia. E apesar dos esforços, eles não pareciam querer parar. Cada noite parecia mais real. Cada vez, tudo soava mais próximo. Ela pouco se importou. Todo mundo morre um dia, mesmo.
Depois do banho, Clara vestiu um jeans desbotado, uma camiseta preta e seu coturno. Amarrou os cabelos curtos num pequeno rabo-de-cavalo e passou as mãos por sobre o rosto. Sentiu algo diferente e correu para olhar-se no espelho. Seu rosto estava como sempre, magro e expressivo. Seu olhar expressava um certo desapontamento.
-Essa merda já tá me deixando paranóica.
Instantes depois, já estava caminhando pela rua. Faltava ainda uma hora, mas ela queria chegar cedo. Um pouquinho ao menos.
Aquele dia estava nublado, mas bastante abafado. Ia chover a qualquer momento, Clara sentia em seus ossos. Mas não levou sequer um guarda-chuva- Eu não sou a bruxa do mágico de Oz pra derreter com água, então, que se foda- e levava apenas uma moedas no bolso e uns 20$ na carteira. O cinema era barato, isso era a menor das preocupações.
Clara tinha um passo apressado, naturalmente. Mesmo que ela não estivesse com pressa, era como se ela estivesse caminhando pra ir para o banco faltando cinco minutos para fechar. Pressa.
Ela associava isso à sua ansiedade crônica. Ela já teve as unhas todas roídas, mas hoje contenta-se em caminhar. Desde cedo sua mãe já dizia Clara, você é muito ansiosa, menina! mas Clara achava isso bom. E justamente por isso ela odeia gente molenga. Falta de propósito na vida, porra.
Enfim, chegou em frente ao cinema. Do outro lado da rua um prédio estava sendo construído. Clara sentou-se no banco e ficou admirando aquele futuro prêmio de concreto, que orgulhava tantas pessoas. Os molengas, no geral. Gente sem propósito na vida. Estúpidos.
Seus pensamentos são interrompidos por propostas, vinda daquela construção. Os pedreiros estavam em horário de almoço.
-E aí, boneca!
Clara ignorou.
-Ih, a boneca é metida.. eu sei do que uma boneca metida gosta..
Clara virou e olhou pro outro lado.
-Ah, bonequnha, cê deve ter uma bela rosca. Dá sua rosca pra mim!
Clara emputeceu-se. Ela gritou.
-E eu lá achei minha rosca no lixo pra dar pra vagabundo? Vai tomar no seu cu!
Os pedreiros riam. Menos o vagabundo, então constrangido, de sorriso amarelo no rosto.
E um ônibus passou a toda velocidade por detrás de Clara, na calçada. Desgovernado, chocou-se contra um prédio.
O estrondo metálico encheu o quarteirão.
20040625
Clara oo1
A televisão passava imagens chatas. Atentados aqui, assaltos acolá, um novo sabão em pó.
Afundada em seu sofá, Clara rodava os canais, entediada.
Ultimamente, poucas coisas deixavam-na animada, realmente. Tudo era chato. E cinza. O mundo ao seu redor era tão preto-e-branco como se a claridade e a escuridão brigassem entre si, o tempo todo. Todo o tempo. Chato.
Ouve-se nitidamente um som levemente agudo, vindo de lugar algum mas onipresente. Aos poucos, Clara vai ficando irriquieta. Desligou a tv. Olhou ao redor, o seu mundinho em preto-e-branco. Era engraçado como tudo se remontava de uma maneira diferente a cada vez que ela olhava. Ela se levantou e em meio à penumbra, pegou um copo e encheu de um café velho e frio. Tomou num gole só e cuspiu tudo na parede. Quanto tempo havia se passado desde que ela sentou-se naquela poltrona?
Ela tomou o rumo da rua, agora em um passo afobado. Ela passou tanto tempo em frente à TV que ela esqueceu-se de viver. Só que lá fora encontrou um mundo igualmente cinza. Frio. Caótico. Voltou correndo para a segurança de seu lar.
Clara queria se distrair. Clara pegou um livro para ler. Mas o livro estava com as páginas em branco. E um segundo livro também estava assim. E um terceiro, quarto. Todos. Em branco. Como se nada jamais tivesse sido escrito.
Sua mente perdia-se em questionamentos. Cada nova questão parecia ser maior que a anterior. De repente, Clara correu até o espelho. Admirou a sua imagem, bastante deturpada. Tocou o rosto, procurando alguma sensação. Ela não sentia nada. De repente, viu seus olhos lentamente escurecerem. E o som contínuo, agudo, tornar-se mais e mais distante a cada segundo. E sua garganta fechar-se em um abraço vagueiro e esparso, tomando-lhe o ar e sufocando-a lentamente. Ela nada mais via. Nada mais ouvia. Nada mais sentia. Não.
Clara acordou, em um impulso forte e desesperado. Ofegante, olhou ao redor, seu mundinho colorido e medíocre. Ela sorriu. Afundou as mãos no rosto, rindo sozinha. Em um momento de reflexão e auto-crítica matinal, Clara disse:
-Sua filha da puta.
Afundada em seu sofá, Clara rodava os canais, entediada.
Ultimamente, poucas coisas deixavam-na animada, realmente. Tudo era chato. E cinza. O mundo ao seu redor era tão preto-e-branco como se a claridade e a escuridão brigassem entre si, o tempo todo. Todo o tempo. Chato.
Ouve-se nitidamente um som levemente agudo, vindo de lugar algum mas onipresente. Aos poucos, Clara vai ficando irriquieta. Desligou a tv. Olhou ao redor, o seu mundinho em preto-e-branco. Era engraçado como tudo se remontava de uma maneira diferente a cada vez que ela olhava. Ela se levantou e em meio à penumbra, pegou um copo e encheu de um café velho e frio. Tomou num gole só e cuspiu tudo na parede. Quanto tempo havia se passado desde que ela sentou-se naquela poltrona?
Ela tomou o rumo da rua, agora em um passo afobado. Ela passou tanto tempo em frente à TV que ela esqueceu-se de viver. Só que lá fora encontrou um mundo igualmente cinza. Frio. Caótico. Voltou correndo para a segurança de seu lar.
Clara queria se distrair. Clara pegou um livro para ler. Mas o livro estava com as páginas em branco. E um segundo livro também estava assim. E um terceiro, quarto. Todos. Em branco. Como se nada jamais tivesse sido escrito.
Sua mente perdia-se em questionamentos. Cada nova questão parecia ser maior que a anterior. De repente, Clara correu até o espelho. Admirou a sua imagem, bastante deturpada. Tocou o rosto, procurando alguma sensação. Ela não sentia nada. De repente, viu seus olhos lentamente escurecerem. E o som contínuo, agudo, tornar-se mais e mais distante a cada segundo. E sua garganta fechar-se em um abraço vagueiro e esparso, tomando-lhe o ar e sufocando-a lentamente. Ela nada mais via. Nada mais ouvia. Nada mais sentia. Não.
Clara acordou, em um impulso forte e desesperado. Ofegante, olhou ao redor, seu mundinho colorido e medíocre. Ela sorriu. Afundou as mãos no rosto, rindo sozinha. Em um momento de reflexão e auto-crítica matinal, Clara disse:
-Sua filha da puta.
20040611
Sem título (Historieta I)
E lá estava eu, novamente na fila. Eu queria comer sopa. Mas o CD não deixou. Ele disse que eu deveria tomar o caminho das pedras brilhantes. Perto do monte do desodorante. E lá fui eu. Relógio abaixo. Perto da tenda dos índios astecas socioeconômicos anarquistas, eu vi uma placa: "É proibido comer gengibre. E fumar também, lógico".
Admito que senti um pouco de raiva e por isso ateei fogo naquelas barracas de lençol amarelo. Às putas que os pariram se eu não podia comer gengibre. E segui viagem.
Continuei caminhando e encontrei uma bolinha de pinball. Ela foi deslizando até cair num banheiro. Puxa, que tristeza, eu adoro pinball. Uma vez eu gastei todo meu dinheiro no pinball. E quase freqüentei uma casa de reintegração à sociedade. O pinball era minha única preocupação, não tinha mais o que fazer, naquela época. Eu vendi até mesmo meu chapéu de cowboy para jogar. Dois dinheiros, eu acho. Aquele chapéu tinha história. Quando eu cruzei o Mississipi de patinete ele me acompanhou. Isso foi em.
Uma bicicleta me interrompeu:
-Bom dia, gostaria de comprar sabão em pó?
-Não. Obrigado.
-Mas veja só, ele lava mais verde. Ou azul.
-Nah.
-Tem esse que também lava mais vermelho, mas psiu, cá entre nós - fez um movimento pra mim chegar mais perto -, esse aqui é proibido pela guarda civil mundial municipal esquizofrênica do Pólo Norte. Mas eu tenho aqui, pra você. Quer?
-Não. Obrigado. Boa tarde.
A bicicleta saiu resmungando alguma coisa. Idiota. Eu tinha que seguir o meu caminho. E eu segui. Ou quase. Quando eu estava perto do morro dos ventos uivantes, eu me distraí com um gigante perneta e me desviei um pouco. E quando eu cheguei ao fim do caminho, pelo menos era o que me dizia a placa, eu estava na casa de palha maciça, a original desde 1927. Eu sabia que não era lá, mas já que eu já estava lá mesmo, eu entrei.
O lugar era sujo e cheio de teias de aranha. Em cima da mesa tinha uma caixa de sabão em pó, "Lava mais Roxo" e uma vassoura empenada. Um bilhete dizia:
A Casa de Palha Maciça, sem limpeza desde 1928.
Oras, então é por isso, esse lugar já está há... há... porra, que ano que é esse que estamos? Deve fazer mais de um ano, eu tenho certeza. Outro dia uma aeronave caiu no meu quintal. Isso foi divertido; eu estava lá arando o quintal, e minha vizinha me chamou:
-Jack Jacksonfive! Jack Jacksonfive! Olha só o que eu recebi! Recebi uma carta! Uma carta eu recebi! Oh que alegria! Alegria, alegria, alegria!
-Puxa!
Eu fui em direção ao portão e assim que eu cheguei, CRAC! o som vinha da minha plantação de alface crocante. Quando eu olho para trás, lá está uma nave. Saem dois chimpanzés e uma orangotanga. Eles saem, se deitam no chão, acendem um cigarro e ficam fumando. Deve ter rolado uma putaria naquela nave. Os chimpanzés se esbaldaram, tenho certeza.
Na Casa de Palha Maciça, a original desde 1927 eu não encontrei nada de interessante e refiz meu caminho de volta ao morro dos ventos uivantes para ver se chegava enfim ao meu destino. Dou dois passos e uma pedra diz que está com as costas coçando. Puxa, como eu detesto essas pedras folgadas. Não fazem o mínimo esforço para coçar as próprias costas. É incrível como elas são preguiçosas. Dei uma bicuda e mandei-a à merda. Não dou a mão pra vagabundo.
Então, no morro dos ventos uivantes, eu peguei o caminho certo. Coloquei meu chapéu de piloto e fui caminho adentro. Era um caminho complicado, tinham copos e folhas e cipós. Umas árvores também. Aquelas árvores de pneus estavam com uns belos pneus. Madurinhos de tudo. Mas me ative à minha jornada. Daí, eu me perguntei o por quê de toda aquela chateação. Mas não obtive resposta. Sei lá por que. Mas eu fui seguindo. Junto ao mar de vaga-lumes. E escalei as gavetas para chegar enfim a uma pedra grande e estúpida. Pelo menos era o que dizia a placa. Pedra Grande e Estúpida. Na verdade não a achei assim tão estúpida, nunca parei para medir o coeficiente de inteligência de uma pedra, mas que ela era grande, ah, ela era. Ao longe eu avistei um brilho. Devia ser o caminho das pedras brilhantes. E eu saltei do alto da pedra grande e estúpida e corri teias adentro. Numa floresta lá. Teias e mais teias. Uma aranha gigante canibal e maneta me seguiu. Ela gritava:
-Meus filhotes! Você roubou meus filhotes!
Eu parei e olhei pra ela.
-Eu não roubei nada, señorita!
-Roubou sim! Eles não estão mais aqui!
-Hã.. ok.
E dei no pé. A aranha gigante canibal e maneta não era apenas gigante e canibal e maneta. Era também esquecida! Aposto que também era analfabeta. Ou pelo menos disléxica.
Eu enfim cheguei ao monte do desodorante. Tinha um cheiro bom lá. Mas a placa era taxativa:
MORRO DO DESODORANTE.
Mantenha os braços erguidos.
Daí eu ergui os braços para não desrespeitar a lei. Mas pomba, e se eu fosse maneta? Aposto que a aranha gigante canibal maneta esquecida e possivelmente diléxica ou analfabeta ficava naquela floresta de merda fazendo teias porque ela não podia chegar ao delicioso monte do desodorante. Oh que cheiro. Oh que vida.
A parte ruim do morro do desodorante era quando ele vencia. Puxa, não tem nada pior que monte do desodorante vencido. Não dá nem pra chegar perto. Mas aquele dia o monte tava bom. A parte muito boa do monte é que depois que você vai lá você passa 1 mês sem suar. Mas nem uma gotinhazinha pequeninha de nada. Ele te deixa sequinho e cheiroso. Acho que era por isso que devíamos ficar com os braços levantados. Pro sovaco, o antro do suor, ter uma proteção bem super. Deve ser por isso.
Chegando ao caminho das pedras brilhantes, eu peguei duas pedrinhas e enfiei no bolso. Uma terceira eu joguei ao longe, em direção ao lago de suco de nectarina. Que estranho, não me lembrava desse lago. E seguindo o caminho, muito longo por sinal, eu não via outra coisa além de pedras brilhantes e suco de nectarina. Devo ter andado uns 932 dias. Por aí. Quando cheguei ao final do caminho das pedras brilhantes, abracei a placa que assim o dizia e fechei os olhos, relembrando qualquer um dos fatos dessa jornada. Me lembrei do cavalinho de pau que eu penhorei pra pagar um cara pra guardar meu lugar na fila. Daí, eu lembrei da fila. A fila já deve ter andado!! Abri os olhos e começou a chover. Olhei para o lado e lá estava o meu CD com um prato de sopa nas mãos.
-Feliz Aniversário, Jack Jacksonfive!
Sopa. Que bizarro. Era justamente o que eu queria!
Atônito, eu sorri. O que mais eu podia ter feito?
Admito que senti um pouco de raiva e por isso ateei fogo naquelas barracas de lençol amarelo. Às putas que os pariram se eu não podia comer gengibre. E segui viagem.
Continuei caminhando e encontrei uma bolinha de pinball. Ela foi deslizando até cair num banheiro. Puxa, que tristeza, eu adoro pinball. Uma vez eu gastei todo meu dinheiro no pinball. E quase freqüentei uma casa de reintegração à sociedade. O pinball era minha única preocupação, não tinha mais o que fazer, naquela época. Eu vendi até mesmo meu chapéu de cowboy para jogar. Dois dinheiros, eu acho. Aquele chapéu tinha história. Quando eu cruzei o Mississipi de patinete ele me acompanhou. Isso foi em.
Uma bicicleta me interrompeu:
-Bom dia, gostaria de comprar sabão em pó?
-Não. Obrigado.
-Mas veja só, ele lava mais verde. Ou azul.
-Nah.
-Tem esse que também lava mais vermelho, mas psiu, cá entre nós - fez um movimento pra mim chegar mais perto -, esse aqui é proibido pela guarda civil mundial municipal esquizofrênica do Pólo Norte. Mas eu tenho aqui, pra você. Quer?
-Não. Obrigado. Boa tarde.
A bicicleta saiu resmungando alguma coisa. Idiota. Eu tinha que seguir o meu caminho. E eu segui. Ou quase. Quando eu estava perto do morro dos ventos uivantes, eu me distraí com um gigante perneta e me desviei um pouco. E quando eu cheguei ao fim do caminho, pelo menos era o que me dizia a placa, eu estava na casa de palha maciça, a original desde 1927. Eu sabia que não era lá, mas já que eu já estava lá mesmo, eu entrei.
O lugar era sujo e cheio de teias de aranha. Em cima da mesa tinha uma caixa de sabão em pó, "Lava mais Roxo" e uma vassoura empenada. Um bilhete dizia:
A Casa de Palha Maciça, sem limpeza desde 1928.
Oras, então é por isso, esse lugar já está há... há... porra, que ano que é esse que estamos? Deve fazer mais de um ano, eu tenho certeza. Outro dia uma aeronave caiu no meu quintal. Isso foi divertido; eu estava lá arando o quintal, e minha vizinha me chamou:
-Jack Jacksonfive! Jack Jacksonfive! Olha só o que eu recebi! Recebi uma carta! Uma carta eu recebi! Oh que alegria! Alegria, alegria, alegria!
-Puxa!
Eu fui em direção ao portão e assim que eu cheguei, CRAC! o som vinha da minha plantação de alface crocante. Quando eu olho para trás, lá está uma nave. Saem dois chimpanzés e uma orangotanga. Eles saem, se deitam no chão, acendem um cigarro e ficam fumando. Deve ter rolado uma putaria naquela nave. Os chimpanzés se esbaldaram, tenho certeza.
Na Casa de Palha Maciça, a original desde 1927 eu não encontrei nada de interessante e refiz meu caminho de volta ao morro dos ventos uivantes para ver se chegava enfim ao meu destino. Dou dois passos e uma pedra diz que está com as costas coçando. Puxa, como eu detesto essas pedras folgadas. Não fazem o mínimo esforço para coçar as próprias costas. É incrível como elas são preguiçosas. Dei uma bicuda e mandei-a à merda. Não dou a mão pra vagabundo.
Então, no morro dos ventos uivantes, eu peguei o caminho certo. Coloquei meu chapéu de piloto e fui caminho adentro. Era um caminho complicado, tinham copos e folhas e cipós. Umas árvores também. Aquelas árvores de pneus estavam com uns belos pneus. Madurinhos de tudo. Mas me ative à minha jornada. Daí, eu me perguntei o por quê de toda aquela chateação. Mas não obtive resposta. Sei lá por que. Mas eu fui seguindo. Junto ao mar de vaga-lumes. E escalei as gavetas para chegar enfim a uma pedra grande e estúpida. Pelo menos era o que dizia a placa. Pedra Grande e Estúpida. Na verdade não a achei assim tão estúpida, nunca parei para medir o coeficiente de inteligência de uma pedra, mas que ela era grande, ah, ela era. Ao longe eu avistei um brilho. Devia ser o caminho das pedras brilhantes. E eu saltei do alto da pedra grande e estúpida e corri teias adentro. Numa floresta lá. Teias e mais teias. Uma aranha gigante canibal e maneta me seguiu. Ela gritava:
-Meus filhotes! Você roubou meus filhotes!
Eu parei e olhei pra ela.
-Eu não roubei nada, señorita!
-Roubou sim! Eles não estão mais aqui!
-Hã.. ok.
E dei no pé. A aranha gigante canibal e maneta não era apenas gigante e canibal e maneta. Era também esquecida! Aposto que também era analfabeta. Ou pelo menos disléxica.
Eu enfim cheguei ao monte do desodorante. Tinha um cheiro bom lá. Mas a placa era taxativa:
Mantenha os braços erguidos.
Daí eu ergui os braços para não desrespeitar a lei. Mas pomba, e se eu fosse maneta? Aposto que a aranha gigante canibal maneta esquecida e possivelmente diléxica ou analfabeta ficava naquela floresta de merda fazendo teias porque ela não podia chegar ao delicioso monte do desodorante. Oh que cheiro. Oh que vida.
A parte ruim do morro do desodorante era quando ele vencia. Puxa, não tem nada pior que monte do desodorante vencido. Não dá nem pra chegar perto. Mas aquele dia o monte tava bom. A parte muito boa do monte é que depois que você vai lá você passa 1 mês sem suar. Mas nem uma gotinhazinha pequeninha de nada. Ele te deixa sequinho e cheiroso. Acho que era por isso que devíamos ficar com os braços levantados. Pro sovaco, o antro do suor, ter uma proteção bem super. Deve ser por isso.
Chegando ao caminho das pedras brilhantes, eu peguei duas pedrinhas e enfiei no bolso. Uma terceira eu joguei ao longe, em direção ao lago de suco de nectarina. Que estranho, não me lembrava desse lago. E seguindo o caminho, muito longo por sinal, eu não via outra coisa além de pedras brilhantes e suco de nectarina. Devo ter andado uns 932 dias. Por aí. Quando cheguei ao final do caminho das pedras brilhantes, abracei a placa que assim o dizia e fechei os olhos, relembrando qualquer um dos fatos dessa jornada. Me lembrei do cavalinho de pau que eu penhorei pra pagar um cara pra guardar meu lugar na fila. Daí, eu lembrei da fila. A fila já deve ter andado!! Abri os olhos e começou a chover. Olhei para o lado e lá estava o meu CD com um prato de sopa nas mãos.
-Feliz Aniversário, Jack Jacksonfive!
Sopa. Que bizarro. Era justamente o que eu queria!
Atônito, eu sorri. O que mais eu podia ter feito?
20040531
A Caixa
James é um detetive. Meio preguiçoso, mas quase ele consegue completar seus casos.
David é um maníaco. Sádico e bem vestido, está sempre acima de qualquer suspeita.
Estela é bonita. Ela namora James, secretamente, e sonha casar-se com ele, em breve.
Eles vivem na mesma cidade, Graceland. Estamos na década de 50.
David passou a madrugada planejando. E o plano seria de fácil execução. Ao ouvir os pássaros cantarolando lá fora, virou-se para a janela e viu os primeiros esboços do que seria um dia ensolarado. A bomba-relógio estava quase pronta. Tinha pólvora suficiente para explodir um carro-forte. Mas as suas intenções eram outras. Terminado o artefato, ajustou-o para se autodetonar em uma hora. Ele o colocou, cuidadosamente, em uma caixa de bolo bonita e cor-de-rosa. Amarrou a caixa, colocou-a embaixo do braço e saiu à rua em direção a confeitaria. Olhou para trás para ver se não havia alguém, mas estava apenas seu prédio se afastando lentamente. O frio da madrugada ainda perdurava no ar.
David chegou a confeitaria e entregou a caixa a senhorita do balcão. Seu coração ainda doía do amor não correspondido. Agora ele teria sua vingança. Não suficiente em seu ato, saiu da padaria e dirigiu-se ao primeiro telefone público que encontrara.
6:23. O telefone na delegacia toca.
-Alô?
-Aqui do olho-mágico do meu apartamento eu testemunho Roma arder em chamas. Enquanto não vejo Nero em cinzas eu não ligo pros bombeiros. Uma hora.
-Como?
-Enquanto a fogo não se alastra, Nero não vê o perigo. Mas o bolo, o qual não se come, se consome. A caixa esconde a faísca do resto do verdadeiro amor.--clic.
-Alô? Alô? Merda.
James olhou afoito ao redor. Ele não sabia bem o que fazer. Ele tinha um maníaco solto por aí. Ele avisou seus colegas. Mas pelo visto ninguém estava a fim de escutar a sua história. Apenas um policial o ouviu e deu crédito. Seu nome era William. William e James subiram correndo no carro e disparam rua abaixo. Procurariam por todas as caixas de bolo que fossem necessárias.
Já eram 6:41.
A senhorita do balcão chamava-se Ruth. Ela recebeu a caixa e deixou lá de lado. O bolo não era pra ela mesmo. Era pra Estela. E a Estela estava em casa. Ela chamou o menino.
-Menino, me faz um favor. Leva essa caixa pra Estela. Um moço a deixou aqui pra ela, mas ela não tá. Eu te dou uns trocados
-Tudo bem!
E o garoto, aparentemente de uns 9 anos, talvez 10 pegou a caixa e seus trocados. Ele parou na banca de jornal. Comprou dois chicletes e um gibi. Passando em frente a Igreja, o sino bate. Anuncia as 7 horas. Ele sorri. Parece que foi ele que causou o sino. Ele precisa pegar o bonde, que está passando já, então sai correndo balançando a mão e gritando. Consegue puxar-se para cima do bonde a tempo. Senta-se ao fundo do transporte com a caixa sobre as pernas. Mascando chiclete meio ofegante, o garoto fala a si mesmo:
-Que bom que eu consegui pegar o bonde. A Estela mora do outro lado da Cidade. Eu ia levar umas quatrocentas horas pra chegar lá.
Ele abre o gibi satisfeito, meio desajeitado por causa da caixa.
James está vagando por aí, e William está mais empenhado que ele na investigação em outros lugares. Então, ele resolve parar na confeitaria.
-Diabos, já são 7:05 e eu ainda não comi. Só um bolinho e eu sigo pro serviço. Bom dia, um bolinho de chocolate, por favor.
-Bom dia! Chocolate com café ou chocolate com creme?
-Chocolate com creme, por favor. Ah, falando em café, me dá um, por favor, também.
-É claro!
-Ah, Ruth, me dá também um bolinho de café. Eu estou faminto.
-Faminto, deve estar, trabalhando a madrugada toda. Suas olheiras parecem dois túmulos. Deus me livre. Mas meus bolinhos são mesmo especiais. Vou te dar um caprichado. Não deve ser tão caprichado quanto o bolo que foi deixado para a Estela aqui de manhã, mas já é de bom tamanho.
-Bolo para Estela?
-É, um senhor deixou uma caixa aqui. "Para Estela" dizia o cartão. Deve ser mais um admirador dela. Uma caixa linda, bem embrulhada. Um senhor muito distinto eu diria.
-Puxa. Ela é mesmo uma mulher e tanto. Bem, obrigado pelos bolinhos! Quanto eu lhe devo?
-Ah, 5$ pagam e a gente não fala mais nisso!
-Hahah, tudo bem, Ruth, obrigado. Bom dia. Ah, Ruth, você tem horas?
-São 7:12, em ponto, detetive!
O menino está muito curioso e começa a mexer na caixa, para tentar dar uma espiadela em bolo certamente tão bonito e evidentemente pesado. Ele afasta um pouco as fitas que amarram a caixa e começa a levantar uma pontinha, lentamente, só uma espiadela.
-MENINO! O que você tá fazendo?
-Nada, Sra. Hemmingway, eu estava apenas arrumando um pouco os enfeites da caixa.
-Oras, menino enxerido. Pare de ficar fuçando no que não é seu. Para quem é este bolo?
-É para a Estela. A D.Ruth pediu que eu entregasse a ela. A idade deve estar pesando...
-Oras, não diga tal asneira. É claro que ela não pôde entregar a caixa porque ela precisa cuidar da confeitaria.
-Pode ser. Mas eu não me importo, ela me pagou para isso mesmo!
-E você bisbilhotando.
-Não, nunca. Eu sou um menino de palavra!
-Hmpf, vejo a palavra que você tem.. Minha nossa, esse bonde vai parar de novo pra mais gente subir? Assim a gente não vai chegar nunca!
James sobe no bonde. E senta-se no primeiro acento.
Em seguida, sobe David e senta-se ao lado de James, no único acento disponível.
-Dia bonito, hein?
-É, um dia esplêndido. Realmente. Mas o que o faz acordar tão cedo em um domingo?
-Ah, negócios. Precisava resolvê-los antes de segunda-feira.
-Logo imaginei! Você realmente parece ser um homem distinto, de negócios! Eu nunca falho!
-É, realmente, nunca falha! Mas e você? O que faz acordado tão cedo?
-Ah, eu tenho uns problemas pra resolver. Porém, daqui a uma hora mais ou menos eu vou à casa de minha amada, pedi-la em casamento.
-Puxa! Meus parabéns!
-Pois é, estou animadíssimo, já vou para lá, agora. Depois eu resolvo os meus tais problemas.
-É verdade, Sr..., Acho que nós não fomos apresentados.
-Sr. Smith. Mas pode me chamar de James.
-Prazer em conhecê-lo, James, me chamo David.
-Igualmente.
-Mas então, continuando, acho que todo homem precisa resolver suas felicidades antes dos problemas. A não ser que a felicidade seja parte do problema.
-Puxa, esse bonde anda muito lentamente. Veja só, já tô até ficando com barba de tanto esperar.
-Oras, deixe de dizer bobeiras, menino! O bonde está no ponto, no horário de sempre.
-Só se for na tartarugolândia.
-Mas eu estou falando sério. Pareço ser uma senhora de brincadeiras? São 7:19 e nós estamos passando em frente à rua Nashville.
-Rua Nashville?? Putz! é onde eu desço! Adeus, Sra. Hemmingway!
O garoto desce, correndo.
-A caixa, menino! Você esqueceu seu bolo aqui!
-Minha nossa! A caixa!
O bonde já está longe.
-Puxa! Toda essa gritaria me acordou! Eu acabei de passar do meu ponto. Vou ter que esperar o bonde dar toda a volta.
-Desculpe se eu o atrapalhei, James.
-Ah, imagine! que horas são agora?
-São 7:20.
-Viu só? Nós é que perdemos a noção do tempo papeando sobre a Estela.
-Estela? Qual Estela?
-A minha noiva, horas. Aliás, futura noiva. Ela trabalha na confeitaria da Ruth.
-Eu a conheço. Moça muito distinta. Ama mesmo o senhor, não dá espaço para nenhum outro homem.
-Pois é...
David olha para trás e vê de relance a caixa sobre o banco. A sua caixa.
-David? Você está bem?
-Estou sim, claro! Eu preciso ir. Tenho certeza que vocês serão muito felizes. Adeus, James.
-Adeus, David!
David desce do bonde, rapidamente e logo o veículo se afasta.
A bomba explode.
David olha o veículo em chamas. O único movimento pertinente é o das chamas. Nenhum mais. Ele joga seu chapéu no chão. Dá uma cusparada em direção ao bonde destruído e entre na floricultura. As notícias correm rapidamente. Compra duas dúzias de rosas vermelhas para Estela. Afinal, ela precisará de um ombro para chorar.
E ele vai estar lá.
20040519
Cachinhos Dourados - o poema bagaceiro.
De cachinhos dourados, saltitava pela floresta.
Caminhando por lá, encontrou uma casa
Por onde entrou sem nenhuma ressalva.
Cachinhos dourados entrou e gritou:
"Tem alguém aí, por favor?"
Ninguém respondeu e avistou, a menina legal,
sobre a mesa três belos pratos de mingau.
Sua barriga fazia mais barulho que um trovão
E Linda foi comer, pois não tinha outr'opção.
pelo prato pequeno a menina iniciou
Estava muito quente e sua língua ela queimou.
Em seguida foi tentar o do prato cor-de-rosa
E cuspiu por toda parte, era frio como rocha.
Enfim do prato grande ela se aproximou
Era morno e gostoso, e a garota aprovou.
Comeu tudo direitinho e sentiu-se cansada
E ao quarto ela foi pra dar uma cochilada.
Como nos mingaus, cachinhos testou
cada uma das três camas, e assim se passou:
"Essa cama é muito mole e pequena,
Tinha gostado dela, o que é realmente uma pena"
"Essa outra é muito dura, feia e desajeitada
nessa eu não durmo nem que me encham de
[porrada"
E na última cama, Cachinhos se deitou
Se mexeu, se coçou e foi assim qu'ela cochilou.
Instantes depois chegaram os três ursos num
[jegue
E os apresento a vocês assim como se segueA mamãe urso foi a primeira a entrar
E já percebeu que alguém esteve no lugar
O ursinho entra correndo num ZÁS
E vai correndo pra mesa de jantar
E por fim o papai urso, gordo e bonachão
Apesar de cara feia, tem um grande coração.
Os três se reúnem em torno da mesa pra comer a
[refeição
Mas como pode-se imaginar, houve uma grande[decepção
Em coro, eles disseram: "Ei, isso não é legal.Alguém mexeu no nosso delicioso mingau".
E procuraram por evidências em toda casa
E mamãe urso já sabia que tinha alguma causa.
Mas nada encontraram e resolveram ir dormir com
[fome
E no quarto, lá em cima você sabe quem dorme.
Assim que chegaram ao quarto e notaram a
[invasora
Bradaram e rugiram, ameaçaram-na com uma[vassoura.
Linda, indefesa, encolheu-se e chorouE papai urso, mesmo bondoso, não se consolou:
"Sua garota levada, menina sem educação
Entra em nossa casa e apunhala-nos o coração
Come nossa comida e nem diz obrigado
Sem esquecer que você não era um convidado.
E por fim sobe em nosso quarto e apropria-se da
[cama
Como se fosses uma indomável, formosa dama.Mas saiba que beleza não se põe em mesa
E nem se come a comida alheia e sai-se ilesa.
Da próxima vez, se houver, tenha mais respeito
Não invada a propriedade alheia ou chamamos o
[prefeito
E você e sua família desocupadaSerão daqui finalmente levadas."
Cachinhos dourados saiu correndo aos prantos
E assim nunca mais voltou àquela casa dos
[espantos.
Pois Cachinhos aprendeu a liçãoQue nunca se deve comer na casa dos ursos
Se não for armada com um três-oitão.
20040514
Janete
Na fria e escura São Paulo, num bar às 6h30m da manhã encontramos a nossa heroína.
Janete, tomando o seu tradicional café preto, puro, com açúcar e uma pitada de canela, sorri perante o jornal, tão fresco como o ar das montanhas Filipinas. Meia hora depois ela já está caminhando. Na pressa, esqueceu o jornal sobre o banco do boteco. Dane-se. Ela tinha mais o que fazer. Naquele belo dia, chuvoso e cinzento, ela encontraria o homem da sua vida.
Conheceu-o por acaso. Ele tinha mandado uma carta ao jornal reclamando do excesso de ativistas malas que reclamam de tudo. E o jornal publicou! Sensacional. Janete pensou: "Putz, é ele!". Respondeu no endereço indicado e pronto: Eles começaram a se corresponder por cartas.
Ele morava em São Caetano. Janete achava que era uma cidade de bosta, mas seu conceito melhorou, sabe-se lá o porquê. Era próximo demais pra ser verdade. E por isso mesmo, Janete e Tomas decidiram mutuamente e telepaticamente por não se encontrar antes do tempo. Janete achava tudo o máximo. O mistério. Todo aquele suspense. E o dia havia chegado.
Eles haviam marcado cedo para aproveitarem bem o dia. Janete tinha lhe comprado meia dúzia de charutos. "Cubanos e dos bons, dona, enrolado nas coxas de cubanas fartas", disse o homem da barraquinha. Ela fez que acreditou, mas no fundo sabia que no mínimo foi uma puta qualquer com varizes e tudo, que enrolou um tabaco vagabundo com papel machê. Mas eram lindos. Afinal, o que mais dar a um homem com um gosto tão refinado e provavelmente com mais discos que poderia contar. "Charutos", ela pensou. E charutos ela comprou.
Tinham marcado num shopping, às 10h30m. Ia estar mais vazio. E ainda assim seria mais seguro. Mas ainda faltava uma hora e pouco pro encontro. Janete estava ansiosa e constrangida. "Que coisa ridícula, namoradinho por carta". Mas ela sabia que ele não era apenas um namoradinho. E que aquelas cartas representavam o amor de um ao outro, aos cuidados de perfumes borrifados e todas essas breguices. E Janete estava exatamente como disse que estaria: camiseta vermelha com uma estampa da velha Joan, calças jeans e uma flor na cabeça. Um cravo negro. Tomas disse que se aproximaria dela assim que a reconhecesse. Ela gostou que fosse dessa maneira. O suspense ficava maior. E enfim, o shopping abriu. Ela entrou correndo e sentou-se no banco em frente à livraria, como eles haviam combinado. Tudo lindo. Em menos de uma hora, ela e Tomas se conheceriam. Enfim.
Um homem feio, alto, meio ranzinza se aproxima dela. Ele a faz uma pergunta. "Atrás de você", responde ela, aliviada de que aquele homem burro não era Tomas. Enquanto ainda se diverte, ela nota um homem bonito a observando, ao longe.
O homem a fita, fixamente. Ela sente um certo constrangimento.
O homem se dirige rapidamente em direção a ela.
Seus passos longos e rápidos, quase ritmados, lembravam vagamente um trotar. Coisa engraçada, ela pensou depois.
E ela continua fazendo-se de interessada no livro. Para não deixar claro sua afobação. E uma voz a diz:
-Janete?
Ela olha, sorrindo. Era ele! Ela sabia que era ele!
-Tomas?
Ele sorri em resposta. A segura pelo braço e diz:
-Temos que sair daqui.
-Mas...?
E ela é puxada por Tomas, que a leva rapidamente para seu carro. "Como ele dirige rápido" ela pensou. E no carro, ele não dizia uma palavra. Estava muito compenetrado.
O carro pára. Janete não sabe que local é aquele. É longe pra caramba. Muito isolado e Janete sente um frio na espinha. Tinha algo estranho acontecendo.
Ele desce do carro, e segundos após, abre a porta do passageiro:
-Que bom te encontrar. Venha.
E leva Janete para dentro daquela casa. Janete está apavorada. "Que merda tá acontecendo?".
-Não se preocupe. Não vai te acontecer nada. Só venha comigo, por favor. Rápido.
-Eu te comprei charutos.
-Charutos? Eu adoro charutos! Como adivinhou? Acho que você é você mesmo.
-óqueei... mas espera.
-que é?
-Pra onde tá me levando? Por que a pressa?
Tomas nada responde. Entra por uma porta, por duas e descem, descem muito. "Pros quintos dos infernos" pensa Janete. E continuam a descer.
Param em um lugar escuro, silencioso e com uma única porta a frente. Entram, obviamente.
Lá, um brilho intenso acometia toda a sala. E nessa momento Tomas largou de sua mão, deixando Janete desnorteada. Ele a chama e ela guia-se por sua voz.
Quando seus olhos acostumam-se à claridade, Janete vê uma espécie de caverna. E ao longe, mais uma vez, está Tomas. Ele a chama para perto de si.
-Janete, olhe para este espelho. E me diga o que você vê.
-Oras, eu me vejo.
-Veja além, preste atenção. Olhe cuidadosamente. Eu sei que é você.
E Janete fita-se por alguns minutos. Em silêncio. Sua imagem às vezes parece dançar.
Tomas chama-lhe a atenção mais uma vez.
-Toque-o.
E assim que Janete aproxima-se do espelho para tocá-lo; ela sente vibrações vindo do espelho, como se fosse um campo mágico. Esse espelho tinha realmente algo incomum e ela não quer tocá-lo pois sabe o que vai acontecer. Mas sua ansiedade e curiosidade a instigam para tal. Aproxima a mão lentamente e toca a superfície com a ponta dos dedos. Então pressiona com a palma da mão.
-É sólido.
Ao pronunciar essas palavras, Janete ainda tem tempo de ver atrás de si Tomas com suas cartas em uma das mãos, um olhar apaixonado e uma pistola na outra mão.
-Eu te amo, Janete.
BUM!
Janete, tomando o seu tradicional café preto, puro, com açúcar e uma pitada de canela, sorri perante o jornal, tão fresco como o ar das montanhas Filipinas. Meia hora depois ela já está caminhando. Na pressa, esqueceu o jornal sobre o banco do boteco. Dane-se. Ela tinha mais o que fazer. Naquele belo dia, chuvoso e cinzento, ela encontraria o homem da sua vida.
Conheceu-o por acaso. Ele tinha mandado uma carta ao jornal reclamando do excesso de ativistas malas que reclamam de tudo. E o jornal publicou! Sensacional. Janete pensou: "Putz, é ele!". Respondeu no endereço indicado e pronto: Eles começaram a se corresponder por cartas.
Ele morava em São Caetano. Janete achava que era uma cidade de bosta, mas seu conceito melhorou, sabe-se lá o porquê. Era próximo demais pra ser verdade. E por isso mesmo, Janete e Tomas decidiram mutuamente e telepaticamente por não se encontrar antes do tempo. Janete achava tudo o máximo. O mistério. Todo aquele suspense. E o dia havia chegado.
Eles haviam marcado cedo para aproveitarem bem o dia. Janete tinha lhe comprado meia dúzia de charutos. "Cubanos e dos bons, dona, enrolado nas coxas de cubanas fartas", disse o homem da barraquinha. Ela fez que acreditou, mas no fundo sabia que no mínimo foi uma puta qualquer com varizes e tudo, que enrolou um tabaco vagabundo com papel machê. Mas eram lindos. Afinal, o que mais dar a um homem com um gosto tão refinado e provavelmente com mais discos que poderia contar. "Charutos", ela pensou. E charutos ela comprou.
Tinham marcado num shopping, às 10h30m. Ia estar mais vazio. E ainda assim seria mais seguro. Mas ainda faltava uma hora e pouco pro encontro. Janete estava ansiosa e constrangida. "Que coisa ridícula, namoradinho por carta". Mas ela sabia que ele não era apenas um namoradinho. E que aquelas cartas representavam o amor de um ao outro, aos cuidados de perfumes borrifados e todas essas breguices. E Janete estava exatamente como disse que estaria: camiseta vermelha com uma estampa da velha Joan, calças jeans e uma flor na cabeça. Um cravo negro. Tomas disse que se aproximaria dela assim que a reconhecesse. Ela gostou que fosse dessa maneira. O suspense ficava maior. E enfim, o shopping abriu. Ela entrou correndo e sentou-se no banco em frente à livraria, como eles haviam combinado. Tudo lindo. Em menos de uma hora, ela e Tomas se conheceriam. Enfim.
Um homem feio, alto, meio ranzinza se aproxima dela. Ele a faz uma pergunta. "Atrás de você", responde ela, aliviada de que aquele homem burro não era Tomas. Enquanto ainda se diverte, ela nota um homem bonito a observando, ao longe.
O homem a fita, fixamente. Ela sente um certo constrangimento.
O homem se dirige rapidamente em direção a ela.
Seus passos longos e rápidos, quase ritmados, lembravam vagamente um trotar. Coisa engraçada, ela pensou depois.
E ela continua fazendo-se de interessada no livro. Para não deixar claro sua afobação. E uma voz a diz:
-Janete?
Ela olha, sorrindo. Era ele! Ela sabia que era ele!
-Tomas?
Ele sorri em resposta. A segura pelo braço e diz:
-Temos que sair daqui.
-Mas...?
E ela é puxada por Tomas, que a leva rapidamente para seu carro. "Como ele dirige rápido" ela pensou. E no carro, ele não dizia uma palavra. Estava muito compenetrado.
O carro pára. Janete não sabe que local é aquele. É longe pra caramba. Muito isolado e Janete sente um frio na espinha. Tinha algo estranho acontecendo.
Ele desce do carro, e segundos após, abre a porta do passageiro:
-Que bom te encontrar. Venha.
E leva Janete para dentro daquela casa. Janete está apavorada. "Que merda tá acontecendo?".
-Não se preocupe. Não vai te acontecer nada. Só venha comigo, por favor. Rápido.
-Eu te comprei charutos.
-Charutos? Eu adoro charutos! Como adivinhou? Acho que você é você mesmo.
-óqueei... mas espera.
-que é?
-Pra onde tá me levando? Por que a pressa?
Tomas nada responde. Entra por uma porta, por duas e descem, descem muito. "Pros quintos dos infernos" pensa Janete. E continuam a descer.
Param em um lugar escuro, silencioso e com uma única porta a frente. Entram, obviamente.
Lá, um brilho intenso acometia toda a sala. E nessa momento Tomas largou de sua mão, deixando Janete desnorteada. Ele a chama e ela guia-se por sua voz.
Quando seus olhos acostumam-se à claridade, Janete vê uma espécie de caverna. E ao longe, mais uma vez, está Tomas. Ele a chama para perto de si.
-Janete, olhe para este espelho. E me diga o que você vê.
-Oras, eu me vejo.
-Veja além, preste atenção. Olhe cuidadosamente. Eu sei que é você.
E Janete fita-se por alguns minutos. Em silêncio. Sua imagem às vezes parece dançar.
Tomas chama-lhe a atenção mais uma vez.
-Toque-o.
E assim que Janete aproxima-se do espelho para tocá-lo; ela sente vibrações vindo do espelho, como se fosse um campo mágico. Esse espelho tinha realmente algo incomum e ela não quer tocá-lo pois sabe o que vai acontecer. Mas sua ansiedade e curiosidade a instigam para tal. Aproxima a mão lentamente e toca a superfície com a ponta dos dedos. Então pressiona com a palma da mão.
-É sólido.
Ao pronunciar essas palavras, Janete ainda tem tempo de ver atrás de si Tomas com suas cartas em uma das mãos, um olhar apaixonado e uma pistola na outra mão.
-Eu te amo, Janete.
BUM!
20040309
O Fantasma
Aquele jovem não se enturmava. Durval era seu nome. Todos eram amigos menos ele; ele era inteligente, bonito, mas não. Ele não era compreendido. Geralmente ignorado.
A simples presença dele era um incômodo. Porque afinal, ele era muito alegre, muito cheio de vida e bondoso. Mas ele estava inconformado com essa situação.
Ele tentou agradar. Tentou adequar seus modos aos deles. Mas não dava. Eles eram rápidos demais.
Uma vez, houve um grande piquenique em sua escola. Todos deviam levar um amigo. Mas Durval não sabia o que fazer. Procurou nas páginas amarelas e só sujou seus dedos com aquela tinta vagabunda. Olhou aqui e acolá. Ninguém queria ser seu amigo. Ele falava e as pessoas não o ouviam. Ele não era surdo, tinha certeza disso e assim, não era mudo também. Ele era bem branquinho, mas longe de ser transparente. Certo, não era assim tão bonito e nem tão inteligente. Ele era simpático e esperto; não era o último da sala, mas nem o primeiro. Era normal. Mas por que raios ele não conseguia um amigo?
Chegou o dia do piquenique, faltavam poucas horas para o evento. Durval, a 2 quadras da escola olhava seus colegas de sala passando com seus amigos. Amigos bonitos. Ele tinha certeza que tinha pedido para ser amigo daquela menina loirinha de vestido roxo. E também do menino ruivinho, sardento, sorridente. E do menino de cabelo pixaim que estava lendo no parque. Todos o ignoraram; especialmente o menino do parque. O ignorou, deu um riso nervoso e saiu de passo apressado.
Detrás da árvore, Durval só queria se sentir inserido em meio às brincadeiras. Mas ele sabia que se chegasse sem nenhum amigo, todos apontariam e ririam dele. Ou simplesmente não notariam a sua presença e seu dia seria um pouco mais cinza. E assim, Durval foi ficando mais triste e se afundando em seus pensamentos. Já se sentia humilhado antes mesmo de tentar.
Durval precisava de um amigo para conversar e animá-lo, tirá-lo daquela situação constrangedora.
Durval precisava de um amigo que fizesse todas as crianças ficarem admiradas.
Sendo assim, Durval arrumou um fantasma.
A simples presença dele era um incômodo. Porque afinal, ele era muito alegre, muito cheio de vida e bondoso. Mas ele estava inconformado com essa situação.
Ele tentou agradar. Tentou adequar seus modos aos deles. Mas não dava. Eles eram rápidos demais.
Uma vez, houve um grande piquenique em sua escola. Todos deviam levar um amigo. Mas Durval não sabia o que fazer. Procurou nas páginas amarelas e só sujou seus dedos com aquela tinta vagabunda. Olhou aqui e acolá. Ninguém queria ser seu amigo. Ele falava e as pessoas não o ouviam. Ele não era surdo, tinha certeza disso e assim, não era mudo também. Ele era bem branquinho, mas longe de ser transparente. Certo, não era assim tão bonito e nem tão inteligente. Ele era simpático e esperto; não era o último da sala, mas nem o primeiro. Era normal. Mas por que raios ele não conseguia um amigo?
Chegou o dia do piquenique, faltavam poucas horas para o evento. Durval, a 2 quadras da escola olhava seus colegas de sala passando com seus amigos. Amigos bonitos. Ele tinha certeza que tinha pedido para ser amigo daquela menina loirinha de vestido roxo. E também do menino ruivinho, sardento, sorridente. E do menino de cabelo pixaim que estava lendo no parque. Todos o ignoraram; especialmente o menino do parque. O ignorou, deu um riso nervoso e saiu de passo apressado.
Detrás da árvore, Durval só queria se sentir inserido em meio às brincadeiras. Mas ele sabia que se chegasse sem nenhum amigo, todos apontariam e ririam dele. Ou simplesmente não notariam a sua presença e seu dia seria um pouco mais cinza. E assim, Durval foi ficando mais triste e se afundando em seus pensamentos. Já se sentia humilhado antes mesmo de tentar.
Durval precisava de um amigo para conversar e animá-lo, tirá-lo daquela situação constrangedora.
Durval precisava de um amigo que fizesse todas as crianças ficarem admiradas.
Sendo assim, Durval arrumou um fantasma.
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