Esse texto, uma crônica de uma dia real da minha vida é do dia dez de setembro de 2003.
Eu sou uma pessoa bastante distraída. Eu me distraio e me esqueço das coisas com uma velocidade assustadora. Pode ser efeito da água mineral natural sem gás. Mas o maior problema é que eu acabo falando demais ou agindo demais em momentos errados. Com pessoas erradas. Praticamente todo dia tem um "fora" novo que eu dou por aí. Eu sou o Rei dos Foras.
O mais recente foi esses dias. No centro de São Paulo, estava eu a procurar um suspensório bem bonito e divertido. Eu encontrei! Uma felicidade. Enquanto eu saía saltitante pelas ruas e esquinas cantarolando alguma canção ou hino de alegria extrema, na tentativa de compartilhar minha felicidade decido dar uma moeda a um mendigo. Eu quase nunca dou, nunca tenho grana, mas 25¢ não me fariam falta naquele meu momento de tamanho êxtase.
Numa calçada, aquelas com uma mureta que tem árvores, onde as pessoas se sentam, tinha lá, um de cada tipo: Um sem uma perna, outra com elefantíase, um ou dois cegos, outro com as perninhas engraçadinhas, enfim, uma desgraça ao lado da outra e eu escolhendo qual seria a premiada. E sentada ao lado de tudo isso, uma mulher, também com cara de cansada, com um carrinho de bebês com uma criança dentro. Aquele sol, a criança, o olhar cansado, porra, ela precisava mais de 25¢ do que qualquer outro. Ela tinha uma criança!
Me aproximo. Ela me fita. Eu sorrio. Estendo a mão, coloco a moedinha dentro do carrinho de bebê, jogo a moeda, dou um sorriso ainda maior com um olhar de propaganda de margarina. Aparentemente, ela não ficou feliz. Enfim, viro-me e vou saindo, com um ar de dever cumprido, feliz da vida porque eu ajudei, com pouca coisa, uma mulher necessitada. Dois passos vitoriosos me afastam da mulher.
- EU NÃO SOU MENDIGA NÃO! MAS QUE FILHO DA PUTA! - Pega a minha moeda, taca no chão com violência. Continua aos berros. - EU NÃO PRECISO DESSE SEU DINHEIRO DE MERDA! EU NÃO SOU MENDIGA!
Merda. Fodeu. A mulher estava sentada provavelmente descansando. Tinha uma loja em frente. Daquelas cheias de gente se acotovelando. Alguém deve ter entrado lá e ela ficou esperando a pessoa sair, já que ela com um carrinho de bebê não consegue entrar nesses lugares cheios. E eu piedosamente lhe dou 25¢. Eu saí, sem olhar pra trás, só apertei o passo e torci para que ela não tivesse um bumerangue.