Meu pai aniversariará na próxima sexta-feira e, para celebrar, levará a família para assistir ao novo Harry Potter no cinema. Meu pai e minha irmã são, definitivamente, fãs do rapaz e eu, bem, não. Tanto que vi o primeiro e o segundo filmes inteiros, pedaços do terceiro na HBO e do quarto eu não faço idéia do que acontece. Os livros eu adiei por esses anos com a desculpa de que eu sou ansioso demais e que só leria um Harry Potter quando a saga toda estivesse completa o que é ou não uma mentira deslavada que só o tempo provará. Fato é, eu não iria ao cinema assistir ao quinto Harry Potter sem ter assistido os dois anteriores, por razões óbvias. Além do que, novos personagens podem ter surgido e sendo assim, eu tornaria-me o chato do cinema que vez ou outra levanta a questão "Quem é esse? Ele é amigo ou inimigo? Quais os poderes dele?" ou coisa assim. Para tanto, esta tarde, fui à locadora para locar os dois filmes.
Chovia. Chovia muito. Cheguei à locadora, que estava com metade coberta com um plástico preto, pois está em reforma e com os pés molhados dirige-me ao balcão onde uma moça de cabelos loiros (falsos), que já provara suas habilidades e discernimentos de atendente de videolocadora outras vezes, estava, junto a um computador.
- Oi, eu preciso de três filmes.
- Sim, pois não?
- Eu preciso do terceiro e do quarto filmes do Harry Potter...
- ...
- ... É que é aniversário do meu pai na sexta-feira e ele vai levar todo mundo pra ver o novo filme então, eu achei que precisava recuperar o tempo perdido.
- Ah sim. E qual o outro?
- "Últimos Dias".
- Mas que filme é esse "Últimos Dias" que tá todo mundo pedindo??
- Sabe o filme "Elefante"?
- ...
- Aquele que na capa tem uma moça dando um beijo num rapaz de cabelos bem louros e camiseta amarela, sabe?
- Ah tá. Sei.
- Então! É do mesmo diretor!
- Ah tá. É um documentário, então.
- Não... Nesse "Últimos Dias", o diretor, o Gus Van Sant, conta a história de um rockstar famoso que parece que é baseado na história do Kurt Cobain, do Nirvana e bem, aparentemente ele isolou-se nesse lugar e está vivendo seus... últimos dias.
- ... Ah tá. Um documentário, saquei. Então, você quer o Harry Potter: O Prisioneiro de Azkaban e o Cálice Sagrado, isso?
- Hm. Acho que sim.
- Tá.
E ela saiu de trás do balcão e foi andando pelas prateleiras. Deus sabe o porquê eu fui atrás. Acho que como eu não tinha engolido a história de documentário eu queria respostas. Ela virou ao lado do saco preto de reformas e enquanto ela dirigia-se para a prateleira onde estavam os filmes, eu parei, maravilhado. Um tesouro, daqueles. Dezenas, talvez centenas de filmes em VHS, mal empilhados, em um canto. De súbito, falei:
- Ei! O que são esses filmes? Porque eles estão aqui?
- São pra doação - falou um rapaz que estava junto aos filmes.
Eram pra doação. Pra um orfanato não sei o quê ou asilo blábláblá, não sei, juro que não conseguia ouvir.
- Se você quiser dar uma olhada antes que a gente leve, pode ver quais você quer e pegar. São pra doação mesmo!
Coloquei-me ajoelhado junto a uma pilha de filmes e comecei a ver, um a um.
- Mesmo?
- Claro!
A próxima coisa que percebi foi uma pilha de filmes que batia no meu peito e ainda faltava um pouco menos da metade dos filmes para inspecionar. No final das contas, peguei 45 filmes. Eles deixaram um para trás que estava separado, então, 46. Quarenta e seis filmes semi-novos em folha. Quarenta e seis!
Muitos filmes ruins,
ruins. Muitos filmes ruins,
bons. Alguns bons,
mesmo. Peguei de tudo.
Notei outro vício de linguagem que muitos de nós temos e eu não era exceção. Sabe aqueles filmes que vocês diz que
"Não quer ver nem de graça" ou em casos menos sérios,
"Não pagaria pra ver mas assistiria de graça"? Pois bem, a primeira regra não vi exceções. Mas na segunda, diversos filmes eu pegava, olhava e então, como estava de graça, classificava como
"Nem de graça". Juro que foi bastante esclarecedor.
Dentre tantos filmes bacanas, destacarei alguns dignos de menção.
Vimos
Os Suspeitos à venda, até em bancas promocionais de DVDs de 9,90, o que já era excelente. Aqui, em VHS, a caixa está um pouco danificada mas a fita, intacta!
O pomo da discórdia,
dublado.
Uma incrível surpresa.
E outra, tão incrível quanto.
Um filme que é sempre bom ter em mãos, não é mesmo?
Ah, e é claro! Navalha na Carne e sua excelente (quase sensual) capa.
A parte triste é que alguns filmes estavam sem caixa e outros estavam sob uma goteira. Muitos mereciam estar assim mas outros, não. Assim sendo, salvei quatro:
("Assassinato no Expresso Oriente"; "Os Deuses Devem Estar Loucos II"; "Batman - O Retorno" e; "Era Uma Vez no México".)
E bem, hoje entendi como uma criança se sentiria numa fábrica de doces (o mesmo exemplo pode ser aplicado a
Gordos e
Presuntos) o que, devo dizer, foi incrível. Eu estava não apenas com os pés molhados mas metade das pernas também por causa do guarda-chuva e só fui notar isso novamente quando cheguei em casa. Outra analogia que me vem à cabeça e que cabe é aquele programa Supermarket, no qual as pessoas tinham que encher seus carrinhos com MILHO PARA PIPOCA YOKI ou CANELA EM PÓ PARA DOCES MESTRE CUCA ou seja lá o que o apresentador dizia-os para procurar. Mas um pouco mais livre e tudo.
Enfim, só mais uma fotografia.
In memoriam ao pessoal do orfanato de velhinhos.