Te olhava de lado, meio engraçado, tentando não parecer esquisito. Ajeitei os ombros, corrigi a postura, não sabia como que estava o meu cabelo mas por via das dúvidas, achei melhor deixar como estava. O seu, preso num coque meio desmontado me deixou estranhamente feliz. Parecia gente, sabe? Bonito.
Você tirou o cachecol, mostrando seu pescoço e tentei me lembrar se esse era um daqueles casos em que o corpo fala, como eu vi na TV uma vez. Seria interesse mútuo? Seria um sinal de abertura? Seria calor? Deixo isso pra lá, em dúvida.
No reflexo da janela, encontro seu olhar novamente. Penso em falar mas minha estação é a próxima. Chegando, logo ali. Fico aflito, nos conhecemos só há duas estações. Você poderia descer junto, então eu falaria contigo, com certeza. Não parece o caso. Vou falar algo. Vou dizer qualquer coisa. Oi. Olá. Não, espera, estranho demais. Deixa pra próxima. Abre-se a porta.
Um, dois, três, quatro, cinco e seis passos. Largos, confiantes, olha só pra mim, que belo caminhar, ombro, postura, ritmo. Nos vemos em uma próxima e perpetuaremos nossa paixonite em silêncio, para enfim romper em reencontro qualquer, sem pressa, só sendo. Casualmente paro junto à escada rolante e olho pra trás, como em um filme, uma última cruzada de olhar nessa noite.
E você está olhando pro celular, deus sabe há quanto tempo, mas me parece bem concentrada. Não era mútuo, pressuponho.
Desço as escadas correndo, meu coração se parte um tantico só, dessa casualidade tão empolgante e tão ridiculamente inerte de nós.
Ou de mim.
Mas daí que rolei a catraca e passou.
Tudo, ou quase tudo. Você não foi a primeira nem será a última. Provavelmente a expectativa jamais conseguisse acompanhar a realidade. Talvez em uma próxima eu não me perca em devaneios e de fato diga algo. Talvez tenha sido melhor assim.
Mas foi bonito de ver. Por três estações ali, parecia real, sabe?